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Prefeitura do Rio quer vender sua sede para cobrir déficit

O prefeito Eduardo Paes quer autorização da Câmara dos Vereadores para vender os dois prédios da sede da prefeitura no Centro Administrativo São Sebastião, na Cidade Nova, e mais 12 imóveis na região do Teleporto, avaliados em mais de R$ 1,2 bilhão, para cobrir uma dívida bilionária do tesouro municipal com o Fundo de Previdência do município (Funprevi). A proposta consta do projeto de lei 1.005/2011, que propõe um plano para saldar o débito com o Funprevi, que, em 2009, era de R$ 1 bilhão, o que, segundo projeções, pode contribuir para um déficit de R$ 22 bilhões em 2059. Paes garante que se trata apenas de uma operação contábil, mas o fato é que, se passar, o projeto dá sinal verde para que a venda da sede do Executivo municipal desde a década de 80 seja feita a qualquer momento ou por futuras administrações. O Funprevi tem sido cercado, nos últimos anos, por suspeitas de má gestão. Auditorias feitas pelo Tribunal de Contas do Município (TCM) e por uma CPI na Câmara dos Vereadores revelaram que o fundo, criado em 2002, teve que arcar com o pagamento de funcionários aposentados bem antes, entre 1998 e 2001. Isso aconteceu na gestão do ex-prefeito Cesar Maia, em 2004 e 2005. Cesar tomou como base um parecer da Procuradoria Geral do Município (PGM) que permitiu a operação. Mas o TCM entendeu que, como o Funprevi ainda não existia, caberia ao tesouro municipal arcar com a despesa, o que só voltou a ser feito em 2006. O assunto vem sendo tratado pelo TCM nas contas de gestão do Executivo. As últimas contas aprovadas referentes a 2009, já na administração Paes, estimavam que a dívida em valores atualizados chegava a R$ 1 bilhão naquele ano.

Prefeito nega risco de perder a sede
 Apesar de um artigo do projeto explicitar que o Funprevi pode vender o patrimônio após avaliação prévia, Paes nega que haja risco de a prefeitura perder a sua sede. A lista de imóveis inclui ainda, entre outros prédios, a sede do Centro de Convenções Sul América. Paes argumentou que a proposta se trata apenas de uma operação transferindo os bens mobiliários do Previ-Rio - responsável pela gestão do Funprevi - para o fundo, permitindo o aumento das fontes de receita. Isso seria possível com a venda de terrenos ou a cobrança de aluguéis de imóveis.
- Eu não vou vender a sede da prefeitura. O que propomos foi uma solução para um problema que, em nenhum momento, comprometeria as contas do meu governo. Mas, se o déficit não for resolvido agora, uma futura administração corre o risco de herdar um problema que pode até quebrar a prefeitura. Isso sem contar que os servidores não terão garantia de que receberão suas aposentadorias - argumentou Paes.
Segundo cálculos atuariais do Previ-Rio, o fundo, a continuar a situação atual, ficará insolvente em 2014. Paes, por sua vez, diz que as informações tomam como base o cenário mais pessimista e que, na sua avaliação, o risco de insolvência estaria afastado pelo menos até 2017. O prefeito acrescentou que, se um sucessor seu no cargo concordasse com a venda da sede, o município poderia entrar na concorrência para obter a posse dos imóveis.
Os dois prédios do centro administrativo estão avaliados em quase R$ 200 milhões, segundo o projeto de lei. Por ano, a prefeitura paga cerca de R$ 20 milhões de aluguel ao Previ-Rio. Se a lei for aprovada, esses valores passam automaticamente a serem pagos ao Funprevi. Hoje, os recursos são usados principalmente para a concessão de benefícios a servidores, como cartas de crédito para a compra da casa própria, auxílio-educação, próteses e até cursos de inglês.
O ex-prefeito Cesar Maia atribuiu os problemas à má gestão de Paes:
- A curto prazo o fundo é superavitário. A prefeitura está perdendo o controle sobre a gestão. O que restou dessa enorme ineficiência gerencial é tentar um arrocho absurdo sobre os servidores. Em 2000, o Funprevi tinha R$ 1 bilhão em caixa e, em 2008, chegou a R$ 2 bilhões. Dois anos depois, em dezembro de 2010, só contava com R$ 1,7 bilhão. Ou R$ 300 milhões a menos.
O projeto de capitalização do Funprevi foi encaminhado ao Legislativo em regime de urgência. Mas não houve consenso que permitisse a votação antes do recesso, que começa esta semana. Para tentar cobrir parte da previsão de déficit de R$ 22 bilhões em 2059, o prefeito oferece ainda R$ 199,2 milhões da receita dos royalties do petróleo que vierem a ser arrecadados entre 2015 e 2059. Além disso, a partir de 2017, as amortizações de empréstimos contraídos por servidores através do Previ-Rio seriam destinadas ao Funprevi, em vez de retornarem como recursos disponíveis para a concessão de novos benefícios.

Repasses também serão aumentados

O projeto também estabelece repasses para os próximos 35 anos de cotas extras da contribuição do tesouro municipal ao Funprevi, que hoje corresponde a 22% da folha. Os valores aumentariam progressivamente: cerca de R$ 150 milhões em 2011, chegando a R$ 290 milhões em 2045. O texto deixa em aberto a possibilidade de a prefeitura oferecer outros imóveis de propriedade da administração direta para saldar o déficit.
Apenas oito dos terrenos não edificados do Previ-Rio nas ruas Afonso Cavalcanti, Joaquim Palhares e Ulysses Guimarães valeriam hoje R$ 596,3 milhões. A estimativa foi feita a partir de um estudo de mercado da Diretoria de Investimentos do próprio Previ-Rio. Segundo o documento, a Cidade Nova é uma área valorizada, por estar perto do centro financeiro do Rio. Além disso, também está próxima a áreas valorizadas por projetos da Copa de 2014 (reforma do Maracanã) e dos Jogos de 2016 (Porto Maravilha), o que garantirá boa infraestrutura de transportes. O potencial construtivo chegaria a 270 mil metros quadrados. O preço do metro quadrado construído nessas áreas chegaria a R$ 8 mil para salas e a R$ 11 mil para lojas.
Na Câmara, a oposição critica a proposta de Paes. Até na base governista há resistências. A preocupação dos aliados do prefeito, que têm evitado discutir o assunto abertamente, é com a exploração política que o fato pode ter em 2012, ano em que a maioria tentará a reeleição. Na oposição, uma das que criticam a proposta é a vereadora Sônia Rabello de Castro (PV), ex-procuradora-geral do município. Para ela, a iniciativa fere a Lei de Responsabilidade Fiscal.
- O projeto compromete o uso de receitas futuras e não apenas da atual gestão, o que está em desacordo com a LRF - disse Sônia.
Após a apresentação do projeto, 26 vereadores criaram a Frente de Defesa do Servidor e do Sistema Previdenciário, presidida por Eliomar Coelho (PSOL).
O presidente da Associação dos Servidores do Previ-Rio, Ulysses Silva, também reclama da solução apresentada para sanar a dívida. Segundo ele, há hoje 36 mil servidores aposentados desde 2001 que recebem pelo Funprevi:
- Exigir que o servidor pague por erros que não cometeu é um absurdo.

Por O Globo