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Denúncias derrubam outro ministro, agora do PMDB

O ministro da Agricultura, Wagner Rossi, deixou o cargo nesta quarta-feira. Em carta, alega ter sido pressionado pela família e se diz vítima de injustiça. A informação foi antecipada no Twitter do jornalista Ricardo Noblat e divulgada em seguida no site do GLOBO, que também revelou que a Polícia Federal havia aberto inquérito para investigar as denúncias de irregularidades na pasta. Com a saída de Rossi, já são quatro os ministros a deixar o governo Dilma Rousseff. Além dele, foram demitidos Antonio Palocci (Casa Civil), Alfredo Nascimento (Transportes) e Nelson Jobim (Defesa). O governo ainda não decidiu quem vai substituir Wagner Rossi.
Ao contrário do que fez quando as acusações atingiram o Ministério dos Transportes, a PF instaurou uma investigação formal de número 1526 e tomou na segunda-feira depoimento de Israel Leonardo Batista, ex-chefe da comissão de licitação da pasta comandada pelo ministro Wagner Rossi. No caso dos transportes, a PF sustentou que não havia necessidade de abrir uma nova investigação porque já havia muitos casos de fraudes em licitações de obras em rodovias em apuração pelo país. As novas denúncias em apuração atingem o gabinete do ministro Wagner Rossi.
Na terça-feira, Rossi rebateu matéria publicada pelo jornal "Correio Braziliense", segundo a qual ele e um de seus filhos - o deputado estadual Baleia Rossi (PMDB-SP) - costumam fazer viagens particulares em avião emprestado por uma empresa do ramo do agronegócio com interesses na pasta. Em nota, Rossi, que se tornou ministro este ano, diz que o processo de autorização para que a empresa Ourofino Agronegócios, dona da aeronave, pudesse produzir o medicamento veterinário Ourova Aftosa foi iniciado no ministério em setembro de 2006. No entanto admitiu ter usado o jatinho 'raras vezes'.

Rossi atribui denúncias a Serra

Na carta de demissão, o ministro afirma que estava deixando o governo a pedido de sua família e se defende, afirmando que foi vítima de uma campanha de adversários. Segundo Rossi, nenhuma das acusações indicaria "um só ato (...) que pudesse ser acoimado (tachado) de ilegal ou impróprio no trato com a coisa pública". Afirma que nos últimos 30 dias enfrentou diariamente "uma saraivada de acusações falsas, sem qualquer prova". Sem citar nomes, insinua na carta que sabe de onde partiu a campanha.
"Só um político brasileiro tem capacidade (...) de acumular tantas maldades fazendo com que reiterem e requentem mentiras e matérias que não se sustentam por tantos dias", diz o texto. Segundo auxiliares, Rossi atribui as denúncias a José Serra, ex-governador de São Paulo. Procurado, o tucano não quis comentar a acusação.
Na carta, Rossi elogia a presidente Dilma Rousseff e diz torcer pelo sucesso de seu governo."Deixo o governo, agradecendo a confiança da presidenta Dilma, do vice-presidente Michel Temer, do presidente Lula e dos líderes, deputados, senadores e companheiros do PMDB e de todos os partidos que tanto respaldo me deram", destaca no texto. "Confio que o governo da querida presidenta Dilma Rousseff supere essa campanha sórdida e possa continuar a fazer tanto bem ao nosso país".
Segundo Rossi, a campanha teria "objetivos políticos, em especial a destituição da aliança de apoio à presidenta Dilma e ao vice-presidente Michel Temer, passando pelas eleições de São Paulo onde, já perceberam, não mais poderão colocar o PMDB a reboque de seus desígnios".
Na mensagem, Rossi reclama da divulgação das denúncias feitas pelo ex-presidente da comissão de licitação da pasta Israel Leonardo Batista. Há duas semanas, a revista "Veja" revelou que o lobista Júlio Froés circulava livremente no ministério, montava licitações e ainda distribuía propina a servidores da pasta. Segundo Israel Batista, Fróes tinha até sala junto à comissão de licitação com o aval do então secretário-executivo do ministério Milton Ortolan. Amigo de Rossi há 25 anos, Ortolan foi obrigado a pedir demissão.
"Embora me mova a vontade de confrontá-los, não os temo, (...), mas não posso fazer da minha coragem pessoal um instrumento de que esses covardes se utilizem para atingir meus amigos ou meus familiares. (...) minha família é meu limite. Aos amigos tudo, menos a honra", diz na nota, referindo ao ex-presidente da comissão de licitação.
A Polícia Federal abriu inquérito para investigar as denúncias de irregularidades no Ministério da Agricultura. A PF já tomou o depoimento de Israel Leonardo Batista. No depoimento, Batista confirmou que o lobista Júlio Fróes tinha aval do gabinete do ministro para atuar na pasta.
No depoimento, Batista disse que ouviu o lobista conversar com Ortolan ao telefone e se referir ao "chefão 1". À PF, o depoente não soube dizer se essa expressão era usada para identificar o ministro Rossi. Mas repetiu que foi chamado a uma sala da assessoria parlamentar no oitavo andar do ministério, onde ficava o gabinete de Rossi, onde recebeu uma pasta com notas de R$ 50. Batista diz ainda que não aceitou o dinheiro e devolveu sem contar. Outros servidores também teriam recebido pasta semelhante, mas Batista não indicou essas pessoas.
A investigação da Polícia Federal vem sendo conduzida pelo delegado Leo Garrido de Sales Meira. Foi ele quem tomou o depoimento do ex-chefe da comissão de licitação. Batista esta na Telebrás atuando na mesma função. Ele disse à PF que foi vítima de perseguição, porque não quis participar do esquema.

Confira a íntegra da carta de demissão

"Neste ano e meio na condição de ministro da Agricultura do Brasil, consegui importantes conquistas. O presidente Lula fez tanto pela agricultura e a presidenta Dilma continuou esse apoio integralmente. Fiz o acordo da citricultura, anseio de mais de 40 anos de pequenos e médios produtores de laranja, a quem foi garantido um preço mínimo por sua produção.
Construí o consenso na cadeia produtiva do café, setor onde antes os vários agentes sequer se sentavam à mesma mesa, com ganhos para todos, em especial os produtores.
Lancei novos financiamentos para a pecuária, recuperação de pastagens, aquisição e retenção de matrizes e para renovação de canaviais.
Aumentei o volume de financiamento agrícola a números jamais pensados e também os limites por produtor, protegendo o médio agricultor sempre tão esquecido.
Criei e implantei o Programa ABC, Agricultura de Baixo Carbono, primeiro programa mundial que combina o aumento de produção de alimentos a preservação do meio ambiente, numa antecipação do que será a agricultura do futuro.
Apoiei os produtores de milho, soja, algodão e outras culturas que hoje desfrutam de excelentes condições em prol do Brasil.
Lutei por nossos criadores e produtores de carne bovina, suína e de aves que são protagonistas do mercado internacional.
Melhorei a atenção a fruticultura, a apicultura e a produtos regionais, extrativistas e outras culturas.
Apoiei os grandes, os médios e os pequenos produtores da agricultura familiar, mostrando que no Brasil há espaço para todos.
Deus me permitiu estar no comando do Ministério da Agricultura neste momento mágico da agropecuária brasileira.
Mas, durante os últimos 30 das, tenho enfrentado diariamente uma saraivada de acusações falsas, sem qualquer prova, nenhuma delas indicando um só ato meu que pudesse ser acoimado de ilegal ou impróprio no trato com a coisa pública.
Respondi a cada acusação. Com documentos comprobatórios que a imprensa solenemente ignorou. Mesmo rebatida cabalmente, cada acusação era repetida nas notícias dos dias seguintes como se fossem verdades comprovadas. As provas exibidas de sua falsidade nem sequer eram lembradas.
Nada achando contra mim e no desespero de terem que confessar seu fracasso, alguns órgãos de imprensa partiram para a tentativa de achincalhe moral: faziam um enorme número de pretensas "denúncias" para que o leitor tivesse a falsa impressão de escândalo, de descontrole administrativo, de descalabro. Chegou-se à capa infame da "Veja".
Tudo falso, tudo rebatido. Mas a campanha insidiosa não parava.
Usaram para me acusar, sem qualquer prova, pessoas a quem tive de afastar de suas funções por atos irregulares ou insinuações de que tinham atuado com interesses menos republicanos nas funções ocupadas. O principal suspeito de má conduta no setor de licitações passou a ser o acusador de seus pares. Deram voz até a figuras abomináveis que minha cidade já relegou ao sítio dos derrotados e dos invejosos crônicos. Alguns deles não passariam por um simples exame de sanidade.
Ainda assim nada conseguiram contra mim. Aí tentaram chantagear meus colaboradores dizendo que contra eles tinham revelações terríveis a fazer, mas que não as publicariam se fizessem uma só acusação contra mim. Torpeza rejeitada.
Finalmente começam a atacar inocentes, sejam amigos meus, sejam familiares. Todos me estimularam a continuar sendo o primeiro ministro a, com destemor e armado apenas da verdade, enfrentar essa campanha indecente voltada apenas para objetivos políticos, em especial a destituição da aliança de apoio à presidenta Dilma e ao vice-presidente Michel Temer, passando pelas eleições de São Paulo onde, já perceberam, não mais poderão colocar o PMDB a reboque de seus desígnios.
Embora me mova a vontade de confrontá-los, não os temo, nem a essa parte podre da imprensa brasileira, mas não posso fazer da minha coragem pessoal um instrumento de que esses covardes se utilizem para atingir meus amigos ou meus familiares.
Contra mim nem uma só acusação conseguiram provar. Mas me fizeram sofrer e aos meus. Não será por qualquer vaidade ou soberba minha que permitirei que levem sofrimento a inocentes.
Hoje, minha esposa e meus filhos me fizeram carinhosamente um ultimato para que deixasse essa minha luta estóica mas inglória contra forças muito maiores do que eu possa ter. Minha única força é a verdade. Foi o elemento final da minha decisão irrevogável.
Deixo o governo, agradecendo a confiança da presidenta Dilma, do vice-presidente Michel Temer, do presidente Lula e dos líderes, deputados, senadores e companheiros do PMDB e de todos os partidos que tanto respaldo me deram.
Agradeço também a todos os leais colaboradores do Ministério da Agricultura, da Conab, da Embrapa e de todos os órgãos afins. Penso assim ajudar o governo a continuar seu importante trabalho, retomando a normalidade na agricultura.
Finalmente, reafirmo: continuo na luta pela agropecuária brasileira que tanto tem feito pelo bem de nosso Brasil. Agradeço as inúmeras manifestações de apoio incondicional da parte dos líderes maiores do agronegócio e de suas entidades e também aos simples produtores que nos enviaram sua solidariedade.
Deus proteja o produtor rural e tantos quanto lutem na terra para produzir alimentos para o mundo. Deus permita que tenham a segurança jurídica necessária a seu trabalho que o Congresso há de lhes garantir. Lutei pela reforma do Código Florestal. É importante para o Brasil. Outros, talvez mais capazes, haverão de continuar essa luta até a vitória.
Confio que o governo da querida presidenta Dilma Rousseff supere essa campanha sórdida e possa continuar a fazer tanto bem ao nosso país.
Sei de onde partiu a campanha contra mim. Só um político brasileiro tem capacidade de pautar "Veja" e "Folha" e de acumular tantas maldades fazendo com que reiterem e requentem mentiras e matérias que não se sustentam por tantos dias.
Mas minha família é meu limite. Aos amigos tudo, menos a honra.

Wagner Rossi
Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento"

Por O Globo