Brasileiro gasta com saúde mais que o próprio governo
O sistema de saúde é universalizado, mas a realidade aponta para o desequilíbrio. Pesquisa Conta Satélite de Saúde - Brasil, realizada pelo IBGE, revela que o brasileiro gasta 29,5% a mais do que o governo para ter acesso a bens e serviços de saúde. Enquanto o Estado tem um dispêndio de R$ 645,27 por pessoa, o gasto per capita fica em R$ 835,65. No país, 55,4% das despesas são arcadas pelas famílias enquanto 43,6% cobertas pela administração pública. É a primeira vez que o IBGE calcula a despesa com saúde por pessoa. Em 2008, a despesa do governo foi de R$ 566,43, enquanto a do cidadão, R$ 758,21. Um ano antes, os gastos ainda eram desvantajosos para as famílias: R$ 698,98, enquanto o governo R$ 502,36.
Do total consumido pelas famílias brasileiras, 8,1% corresponderam a gastos com saúde. No bolso das famílias, pesaram mais os serviços privados de saúde que responderam por 52,7% dos gastos. Aumentou também a parcela do orçamento das famílias dedicado à compra de medicamentos. Eles equivaliam a 34,63% do total das despesas, em 2008, e passaram para 35,8%, em 2009.
Em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), no mesmo ano, o percentual foi muito superior, com o Estado respondendo por 72% das despesas com saúde, percentual que não variou muito nos últimos 20 anos. As exceções ficaram com Chile, México e Estados Unidos. Diferentemente do Brasil, na conta dos países da OCDE a administração pública contabiliza também gastos com investimento (construção de hospitais e compra de equipamentos).
-Mantemos um padrão de sistema privatizado, mas que constitucionalmente é universalizado - afirma professora Ligia Bahia, do Laboratório de Economia da Saúde da UFRJ.
Para o gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE, Ricardo Montes Moraes, a disparidade de gastos entre famílias e governo é atípica.
— Isso (o fato de as famílias gastarem mais que o governo) é algo que não é comum e se deve ao fato de a saúde no Brasil ser tão privatizada — considera.
O economista Antonio Correa de Lacerda, da PUC-SP, considera que a estrutura desigual dos gastos com saúde tem se agravado nos últimos oito anos, com o aumento da renda e o envelhecimento da população.
-De um lado, temos a carência de um serviço público de qualidade que empurra as pessoas para o privado e, de outro, milhões têm ascendido socialmente e migrado para planos de saúde - afirma.
Economia encolheu e gastos aumentaram
No ano em que a economia brasileira encolheu 0,3%, os gastos de famílias e da administração pública com saúde como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) subiram. A parcela de despesas com medicamentos, exames, consultas e os custos da administração pública com salários e serviços subiram de 8,3% do PIB, em 2008, para 8,8% do PIB em 2009, revela Pesquisa das Contas Satélites do IBGE.
Para explicar o aumento de gastos com saúde apesar da retração da economia Moraes afirma que os gastos com consumo tendem a variar menos que a economia em geral e que o movimento é comum em países que enfrentam recessões.
— O aumento dos gastos não ocorre só no Brasil, mas em vários países que passaram por crises. A tendência tem a ver com o aumento da renda, o envelhecimento da população e não necessariamente com a introdução de novas tecnologias, que ainda é um tema bastante controverso — afirma.
Em valores, a renda das atividades econômicas relacionadas à saúde somaram R$ 173,3 bilhões, um crescimento de 2,7% frente ao ano anterior e uma desaceleração em relação a 2008, quando ela havia crescido 5,9%.
Gastos da administração pública tiveram maior crescimento em 2009
Apesar de as famílias gastarem mais, foi o governo que experimentou o maior crescimento de participação entre 2008 e 2009 e isso ocorreu com as despesas da administração pública em serviços de saúde, sobretudo, aquelas ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) que chegaram a 5,6% frente 5,4%, da pesquisa anterior. Os gastos da administração pública passaram de 3,5% para 3,8% do produto, enquanto as das famílias subiram de 4,7% para 4,9%. As despesas com medicamentos pelas famílias corresponderam a 1,9% do PIB, um pequeno crescimento frente a 2008, quando correspondiam a 1,8%.
Para Marco Antônio Oliveira, 52 anos, proprietário de postos de gasolina no Rio e em Vitória, os preços de medicamentos como antialérgico e vitamina C, que costuma comprar com frequência, subiram cerca de 10% nos últimos meses. O maior problema nos gastos com saúde vem dos serviços. Ele tem plano de saúde privado e disse que teve “sorte” quando teve de usar um hospital público no Espírito Santo.
-No geral, as pessoas não são bem-atendidas e têm que esperar em filas. A gente deveria usar como parâmetro o serviço público oferecido nos países desenvolvidos dada a carga tributária que temos nesse país. A saúde pública não é boa, a escola pública não é boa e a segurança também não - afirma.
Para Ligia Bahia, não houve mudança na estrutura dos gastos com saúde no país em 2009, que ainda ficaram bastante concentrados nas famílias. Ela não vê uma tendência clara de crescimento das despesas da administração pública apesar da alta de participação verificada pela pesquisa.
- No Brasil, o medicamento é comprado de forma totalmente separada da consulta e não é assim que acontece em um sistema integrado de saúde. A pesquisa mostra como é fragmentado nosso sistema de saúde e isso é preocupante tanto da lado da demanda, com pessoas em planos de saúde, quanto da oferta também. É um gasto muito pesado para as famílias e decepciona ainda não ver o impacto do programa Farmácia Popular nos números - afirma.
Cai número de vagas na Saúde Pública e sobe na rede privada
Mesmo com gasto maior da administração pública, isso não se refletiu no mercado de trabalho. A abertura de vagas caiu entre 2008 e 2009: com 58.961 postos a menos. O volume de serviços de saúde ofertados pelo governo também desacelerou de 6,3%, em 2008, para 5,2%, em 2009.
Na contramão, a saúde privada experimentou um crescimento nos postos de trabalho. As atividades de atendimento hospitalar (parte de internação privada) e outras atividades relacionadas à saúde (consultas e exames privados) tiveram ganho de vagas de 4.446 e 41.506 postos respectivamente. Os pesquisadores não sabem explicar se a redução no número de vagas está relacionada a servidores que se aposentaram e não tiveram a vaga reposta ou se houve aumento da contratação de terceirizados.
— A saúde pode estar perdendo postos diretos para indiretos — avalia Maria Angelica dos Santos, pesquisadora da Fiocruz.
O IBGE pontua que o rendimento nominal dos profissionais da saúde pública subiu passando de R$ 27.904,88, em 2008, para R$ 32.622,88, em 2009. Além disso, avalia que o rendimento do emprego na saúde é maior do que na média da economia em geral.
— Houve a criação de uma série de serviços que não existiam e já que não havia a expertise eles foram contratados fora. Isso não ocorre somente com a saúde — acrescenta Roberto Olinto, da Coordenação de Contas do IBGE.
A pesquisa não faz distinção entre postos de médicos ou de funcionários com atividades correlatas à saúde, como pessoal administrativo de hospital ou Tecnologia da Informação (TI).
Do total consumido pelas famílias brasileiras, 8,1% corresponderam a gastos com saúde. No bolso das famílias, pesaram mais os serviços privados de saúde que responderam por 52,7% dos gastos. Aumentou também a parcela do orçamento das famílias dedicado à compra de medicamentos. Eles equivaliam a 34,63% do total das despesas, em 2008, e passaram para 35,8%, em 2009.
Em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), no mesmo ano, o percentual foi muito superior, com o Estado respondendo por 72% das despesas com saúde, percentual que não variou muito nos últimos 20 anos. As exceções ficaram com Chile, México e Estados Unidos. Diferentemente do Brasil, na conta dos países da OCDE a administração pública contabiliza também gastos com investimento (construção de hospitais e compra de equipamentos).
-Mantemos um padrão de sistema privatizado, mas que constitucionalmente é universalizado - afirma professora Ligia Bahia, do Laboratório de Economia da Saúde da UFRJ.
Para o gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE, Ricardo Montes Moraes, a disparidade de gastos entre famílias e governo é atípica.
— Isso (o fato de as famílias gastarem mais que o governo) é algo que não é comum e se deve ao fato de a saúde no Brasil ser tão privatizada — considera.
O economista Antonio Correa de Lacerda, da PUC-SP, considera que a estrutura desigual dos gastos com saúde tem se agravado nos últimos oito anos, com o aumento da renda e o envelhecimento da população.
-De um lado, temos a carência de um serviço público de qualidade que empurra as pessoas para o privado e, de outro, milhões têm ascendido socialmente e migrado para planos de saúde - afirma.
Economia encolheu e gastos aumentaram
No ano em que a economia brasileira encolheu 0,3%, os gastos de famílias e da administração pública com saúde como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) subiram. A parcela de despesas com medicamentos, exames, consultas e os custos da administração pública com salários e serviços subiram de 8,3% do PIB, em 2008, para 8,8% do PIB em 2009, revela Pesquisa das Contas Satélites do IBGE.
Para explicar o aumento de gastos com saúde apesar da retração da economia Moraes afirma que os gastos com consumo tendem a variar menos que a economia em geral e que o movimento é comum em países que enfrentam recessões.
— O aumento dos gastos não ocorre só no Brasil, mas em vários países que passaram por crises. A tendência tem a ver com o aumento da renda, o envelhecimento da população e não necessariamente com a introdução de novas tecnologias, que ainda é um tema bastante controverso — afirma.
Em valores, a renda das atividades econômicas relacionadas à saúde somaram R$ 173,3 bilhões, um crescimento de 2,7% frente ao ano anterior e uma desaceleração em relação a 2008, quando ela havia crescido 5,9%.
Gastos da administração pública tiveram maior crescimento em 2009
Apesar de as famílias gastarem mais, foi o governo que experimentou o maior crescimento de participação entre 2008 e 2009 e isso ocorreu com as despesas da administração pública em serviços de saúde, sobretudo, aquelas ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) que chegaram a 5,6% frente 5,4%, da pesquisa anterior. Os gastos da administração pública passaram de 3,5% para 3,8% do produto, enquanto as das famílias subiram de 4,7% para 4,9%. As despesas com medicamentos pelas famílias corresponderam a 1,9% do PIB, um pequeno crescimento frente a 2008, quando correspondiam a 1,8%.
Para Marco Antônio Oliveira, 52 anos, proprietário de postos de gasolina no Rio e em Vitória, os preços de medicamentos como antialérgico e vitamina C, que costuma comprar com frequência, subiram cerca de 10% nos últimos meses. O maior problema nos gastos com saúde vem dos serviços. Ele tem plano de saúde privado e disse que teve “sorte” quando teve de usar um hospital público no Espírito Santo.
-No geral, as pessoas não são bem-atendidas e têm que esperar em filas. A gente deveria usar como parâmetro o serviço público oferecido nos países desenvolvidos dada a carga tributária que temos nesse país. A saúde pública não é boa, a escola pública não é boa e a segurança também não - afirma.
Para Ligia Bahia, não houve mudança na estrutura dos gastos com saúde no país em 2009, que ainda ficaram bastante concentrados nas famílias. Ela não vê uma tendência clara de crescimento das despesas da administração pública apesar da alta de participação verificada pela pesquisa.
- No Brasil, o medicamento é comprado de forma totalmente separada da consulta e não é assim que acontece em um sistema integrado de saúde. A pesquisa mostra como é fragmentado nosso sistema de saúde e isso é preocupante tanto da lado da demanda, com pessoas em planos de saúde, quanto da oferta também. É um gasto muito pesado para as famílias e decepciona ainda não ver o impacto do programa Farmácia Popular nos números - afirma.
Cai número de vagas na Saúde Pública e sobe na rede privada
Mesmo com gasto maior da administração pública, isso não se refletiu no mercado de trabalho. A abertura de vagas caiu entre 2008 e 2009: com 58.961 postos a menos. O volume de serviços de saúde ofertados pelo governo também desacelerou de 6,3%, em 2008, para 5,2%, em 2009.
Na contramão, a saúde privada experimentou um crescimento nos postos de trabalho. As atividades de atendimento hospitalar (parte de internação privada) e outras atividades relacionadas à saúde (consultas e exames privados) tiveram ganho de vagas de 4.446 e 41.506 postos respectivamente. Os pesquisadores não sabem explicar se a redução no número de vagas está relacionada a servidores que se aposentaram e não tiveram a vaga reposta ou se houve aumento da contratação de terceirizados.
— A saúde pode estar perdendo postos diretos para indiretos — avalia Maria Angelica dos Santos, pesquisadora da Fiocruz.
O IBGE pontua que o rendimento nominal dos profissionais da saúde pública subiu passando de R$ 27.904,88, em 2008, para R$ 32.622,88, em 2009. Além disso, avalia que o rendimento do emprego na saúde é maior do que na média da economia em geral.
— Houve a criação de uma série de serviços que não existiam e já que não havia a expertise eles foram contratados fora. Isso não ocorre somente com a saúde — acrescenta Roberto Olinto, da Coordenação de Contas do IBGE.
A pesquisa não faz distinção entre postos de médicos ou de funcionários com atividades correlatas à saúde, como pessoal administrativo de hospital ou Tecnologia da Informação (TI).