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Grécia aprova cortes em meio a caos nas ruas

O parlamento grego aprovou, na madrugada desta segunda-feira, horário de Atenas, o pacote de austeridade que permitirá a liberação de um segundo pacote de resgate do do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da União Europeia (UE), no valor de € 130 bilhões. Os parlamentares votaram um a um, em voz alta, sendo que 199 se pronunciaram favoráveis ao pacote e 74, contra, 22 faltaram e cinco se abstiveram. Dois partidos da coalizão do governo expulsaram mais de 40 parlamentares que votaram contra o pacote.
A votação foi realizada em meio a um dos mais violentos protestos realizados em Atenas, o que resultou no incêndio de 34 construções na capital, incluindo prédios históricos, cinemas, cafés e bancos estrangeiros. Além disso, 150 lojas foram saqueadas e 50 pessoas ficaram feridas. Os protestos se estenderam à Salonique, segunda cidade do país, onde policiais calculam que 20 mil pessoas participavam das manifestações, entre outras regiões da Grécia, como as ilhas turísticas de Creta e Corfu. Segundo o primeiro-ministro Lucas Papademos, a turbulência deste domingo foi considerada a pior ruptura da ordem no país, desde 2008, quando a violência tomou conta da Grécia por semanas depois que a polícia atirou em um estudante de 15 anos de idade.

Entre as impopulares medidas a serem implementadas pelo país estão o corte de gastos públicos da ordem de € 300 milhões, a redução de 22% no salário-mínimo de cerca de € 750 ao mês, além da flexibilização de leis trabalhistas (para facilitar a demissão de trabalhadores), redução de € 300 milhões em pensões, a demissão de 150 mil funcionários públicos até 2015 e um pacote de impostos e reformas previdenciárias. Além disso, apresenta uma troca de bônus para aliviar a carga da dívida da Grécia, com a redução do valor real das participações dos credores privados em cerca de 70%. A Grécia precisa dos recursos internacionais antes de 20 de março para pagar dívidas de €14,5 bilhões ou enfrentaria um calote que poderia abalar toda a zona do euro.
A Praça Sintagma, em frente ao Parlamento se transformou num cenário de guerra, com direito a coquetel molotov e pedras atiradas por manifestantes, que eram combatidos com bombas de gás lacrimogênio pela polícia. Diante dos protestos, Papademos declarou que a violência não será tolerada:
— Vandalismo, violência e destruição não têm lugar num país democrático e não será tolerada — disse primeiro-ministro, antes do fim da votação, chamando ainda os legisladores a apoiar as reformas, destacando que tomar a "decisão errada" na votação de socorro levaria a omissão catastrófica e a saída do euro.
Em Atenas, cerca de três mil homens da polícia antidistúrbio tentavam conter a multidão. Não há consenso sobre o número total de manifestantes na praça do parlamento. A polícia contara cerca de 60 mil pessoas, enquanto os sindicatos afirmaram que havia o dobro de participantes nos protestos. Após a ação policial, a maioria dos manifestantes começou a se dispersar, mas pequenos grupos continuavam enfrentando a polícia próximo ao prédio do legislativo, enquanto uma nuvem de gás lacrimogêneo se espalhava pela praça.
Em imagens transmitidas pela televisão, era possível ver focos de incêndio provocados pelos coquetéis molotov lançados pelos manifestantes. Entre os prédios tomados por chamas está o cinema neoclássico Attikon, de 1870, e um edifício que abriga o Asty, um cinema subterrâneo usado pela Gestapo durante a Segunda Guerra Mundial como centro de tortura. Gangues de jovens encapuzados usando bombas incendiárias, destruíram fachadas de lojas e realizaram saques. Filiais de grandes bancos estrangeiros e cadeias multinacionais, como a cafeteria americana Starbucks, também foram atacadas.
— Eles ainda estão atacando a polícia com bombas incendiárias. Não acabou ainda— disse um porta voz da polícia de Atenas.
Na noite de sábado, véspera da votação do pacote pelos parlamentares, Papademos afirmara que a aprovação das medidas, profundamente impopulares, era crucial para evitar o que descreveu como "um caos econômico", enquanto a Alemanha exigia do governo grego mudanças dramáticas em suas políticas para se manter na zona do euro. Segundo ele, não apoiar o projeto de lei significaria "uma moratória caótica" e que gregos podem enfrentar colapso em padrão de vida.
— Isso criaria condições de descontrolado caos econômico e explosão social. O país seria arrastado para um vértice de recessão, instabilidade, desemprego e prolongada miséria, o que , mais cedo ou mais tarde, tiraria o país da zona do euro — sustentou o primeiro-ministro.

Alemanha aumenta pressão sob a Grécia

O Partido Comunista da Grécia acusou Papademos de "mentira e alarmismo", mas a Alemanha aumentou a pressão, afirmando que a Europa necessita de ações, e não de palavras.
— As promessas da Grécia já não são suficiente para nós — disse o ministro de Finanças alemão, Wolfgang Schaeuble, em entrevista publicada na edição deste domingo no jornal “Welt am Sonntag”.
Schaeuble disse que pesquisas de opinião na Alemanha mostram que a maioria dos alemães está disposta a ajudar, "mas é importante frisar que isso não pode ser um poço sem fundo".
— É por isso que os gregos têm que finalmente fechar o poço. Assim poderemos colocar alguma coisa lá. Ao menos, as pessoas estão começando a perceber que não irá funcionar com um poço sem fundo — disse o ministro das Finanças alemão, acrescentando que a Grécia precisa fazer o seu próprio dever de casa para se tornar competitiva, ''independentemente que isso aconteça em conjunto com um novo programa de resgate ou por outra rota que nós realmente não queremos tomar".
Quando perguntado sobre se isso significaria que a Grécia pode deixar a zona do euro, Schaeuble respondeu:
— Isso depende dos gregos. Mas mesmo nesse caso (da Grécia deixar a zona do euro), o que praticamente ninguém acredita que irá acontecer, eles continuarão sendo parte da Europa.
No sábado, em uma jornada de graves advertências e de um debate tumultuado, líderes da coalizão do governo ordenaram que seus parlamentares apoiassem o projeto ou, do contrário, seriam expulsos das listas dos partidos para uma eleição que poderia acontecer em abril.
O ministro das Finanças Evangelos Venizelos disse que o acordo tinha que ser aprovado neste domingo ou o país não conseguiria cumprir o prazo final de 17 de fevereiro para quitar sua dívida com titulares de bônus privados.

Por O Globo