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Sarah Menezes: um ouro para incentivar o Brasil

O judô é imponderável. Dependendo do sorteio de chaves, um atleta precisa vencer cinco lutas seguidas no mesmo dia para virar campeão olímpico. Em caso de derrota, não há uma segunda chance para o ouro - a repescagem serve única e somente para disputar por um bronze. Por isso, tão importante quanto seus treinos, todo judoca que sonha ser campeão precisa ter muita tranquilidade. Coisa que Sarah Menezes mostrou de sobra neste sábado (28) para ganhar o primeiro ouro do Brasil em Londres. "Eu consegui segurar a emoção e pensei numa luta de cada vez", afirmou a judoca, que chegou aos Jogos credenciada como a terceira melhor do mundo na categoria até 48 kg.
Sarah cumpriu com louvor uma missão pouco trivial: foi a primeira atleta do Brasil a participar de uma competição que valia o pódio olímpico. Aos 22 anos, sua idade não foi empecilho. Ela mostrou maturidade e virou a primeira atleta da história do judô feminino a ganhar um ouro olímpico, medalha que não era conquistada pelo Brasil desde Barcelona 1992, com Rogério Sampaio.
Sarah nasceu em Teresina, no Piauí, e começou a praticar judô aos nove anos. No começo, seus pais eram contra a ideia porque consideravam o esporte muito masculino. Para convencê-los a continuar a lutar, a judoca entrou num acordo com os dois. “Eu me comprometi a ir bem nos estudos”, afirmou. Dito e feito. Depois que começou a viajar para fora do Brasil para competir, seus pais pararam de cobrá-la, mas ela manteve o foco nas duas atividades. Até este ano, Sarah nunca tinha trancado a faculdade de Educação Física, mas os treinos para a Olimpíada a forçaram a fazê-lo. Ao ser questionada sobre a primeira coisa que faria após retornar ao Brasil, Sarah disse que voltará a estudar em agosto. “Falta pouco para eu me formar, já estou no quinto período”, disse. Nascida fora de grandes centros de judocas brasileiros como o sul e sudeste do país, Sarah treina em Teresina até hoje. “Foi lá que descobri o judô. Ficar na minha cidade é tudo para mim”, afirmou. Para Sarah, seu ouro pode estimular judocas que, assim como ela, estão longe dos pólos do judô no país. “Eles podem olhar para minha medalha e começarem a acreditar neles mesmos. Tudo é uma questão de confiança, de cabeça”, disse.
Ela fala com propriedade. Sarah disputou Pequim 2008, sua primeira Olimpíada, com 17 anos e pecou pela inexperiência. A piauiense perdeu logo na primeira luta para a húngara Eva Csernoviczki, medalha de bronze neste sábado.. Na final que lhe rendeu o ouro, Sarah derrotou a romena Alina Dumitru, campeã olímpica na China. Bastou uma Olimpíada para confirmar sua ascensão no ranking mundial nos últimos dois anos e inverter a situação a seu favor. Nenhuma das lutas que Sarah ganhou hoje foi por ippon, golpe que encerra a luta na hora. “Isso aconteceu porque eu criei um plano para vencer cada oponente. Não me arrisquei em momento algum”, disse. Para ser campeã, ela passou pela vietnamita Ngoc Tu Van, a francesa Laetitia Payet, a chinesa Shugen Wu, a belga Charline Van Snick e a romena Alina Dumitru. Sarah também contou com um pouco de sorte. Sua maior rival, a japonesa Tomoko Fukumi, a primeira do ranking mundial, foi eliminada nas semifinais por Alina. Foi ali que o caminho da piauiense clareou. E ela sabia disso. “Eu não acreditei quando vi. Na verdade, só chorei após passar pelas semis. Precisava descarregar a responsabilidade e alegria”, disse. Segundo Sarah, a final contra a romena foi a mais fácil de todas as lutas do dia. “Eu estava completamente fria, sem pressão. Foi como se eu estivesse treinando”, afirmou.
A Confederação Brasileira de Judô (CBJ) mostrou que apostava no potencial de Sarah num workshop dado há dois meses no Rio de Janeiro. Numa apresentação dos 14 judocas brasileiros em Londres, Ney Wilson, coordenador da equipe na Olimpíada, disse: “Fiquem de olho na Sarinha”. Ele estava certo. Para completar o dia do judô brasileiro, Felipe Kitadai (mais conhecido como “Kita” pelos gritos da torcida), ganhou o bronze no dia em que completou 23 anos. “A sensação de ficar na Vila Olímpica foi como andar na lua. Ganhar o bronze? Foi como morar no espaço”, afirmou. Com as medalhas de Sarinha e Kita somadas à prata do nadador Thiago Pereira na prova dos 400 m medley, o Brasil encerrou suas primeiras 24 horas em Londres com um pódio completo. 

Por Época