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Forças leais a Gaddafi intensificam ofensiva contra rebeldes

Após ter alcançado sucessos nas últimas semanas, o movimento rebelde líbio sofreu reveses nesta terça-feira. Forças leais ao ditador Muammar Gaddafi interromperam seu caminho rumo à capital com uma forte ofensiva a leste e a oeste de Trípoli, ameaçando recapturar Zawiya, a cidade mais próxima da capital tomada pelos opositores.
Zawiya, cidade de 200 mil habitantes, foi cercada no quinto dia de um destrutivo cerco, com relatos conflitantes sobre quem está no controle. Acredita-se que uma brigada liderada por um dos filhos de Gaddafi, Khamis, lidera o ataque, bombardeando bairros com tanques e tiros de artilharia partindo da periferia e tentando levar suas tropas para a praça dos Mártires, no centro da cidade, onde os rebeldes fizeram um acampamento.
O hospital da cidade está lotado com corpos dos mortos e feridos. Muitas casas foram danificadas, segundo moradores que escaparam nos últimos dois dias. Um homem que fugiu da cidade na segunda-feira disse que as forças pró-Gaddafi tomaram a praça central. 
Um conselheiro do Ministério de Relações Exteriores líbio em Trípoli também afirmou que as forças do governo estavam no controle e que haviam hasteado a bandeira verde na praça. O conselheiro disse --sob condição de anonimato, devido à sensibilidade das conversas-- estar tentando mediar um cessar-fogo com os rebeldes remanescentes.
Mas um morador da vizinha cidade de Sabratha disse que pessoas que fugiram de Zawiya na tarde desta terça-feira afirmaram que a batalha continuava, com rebeldes de volta ao controle da praça.
Os diversos --e contraditórios-- relatos não puderam ser confirmados de forma independente. Serviços de eletricidade, telefone e internet estão cortados na cidade, tornando impossível para as agências de notícias contatar testemunhas na cidade.
Recapturar Zawiya pode significar uma importante vitória a Gaddafi, acabando com uma ameaça ao lado de seu principal bastião, a capital. Se suas forças puderem segurá-la, isso livraria outras tropas para lutar contra rebeldes em outras áreas.
A queda da cidade nas mãos de moradores anti-Gaddafi no início da revolta, que começou em 15 de fevereiro, ilustra o progresso inicial brilhante da oposição. Os rebeldes assumiram toda a parte leste do país e capturaram Zawiya e diversas outras cidades da parte noroeste do território, onde o regime de Gaddafi ficou confinado.
Mas o governo pode estar retomando um certo balanço e sua capacidade de contra-atacar com forças poderosas.
LESTE
 
Ao mesmo tempo, o regime de Gaddafi tem usado sua maior vantagem --poderio aéreo-- cada vez mais para tentar impedir um avanço rebelde a oeste, até Trípoli, pela principal via costeira que sai do leste. O crescente uso de ataques aéreos ressalta a vulnerabilidade das forças rebeldes enquanto eles tentam seguir por um terreno desértico aberto. Mas isso também pode levar as potências mundiais a impor uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia para tirar do ditador essa vantagem.
No leste, as forças de Gaddafi tiveram sucesso no fim de semana ao impedir os rebeldes de chegarem a Trípoli, repelindo-os de Bin Jawad, uma pequena cidade a 600 quilômetros da capital, e forçando-os a voltarem para o porto petrolífero de Ras Lanuf, ainda mais ao leste.
Nesta terça-feira, as tropas dispararam vários foguetes contra um contingente rebelde que tentava sair de Ras Lanuf. Ao menos 26 feridos foram levados ao hospital da cidade, alguns sem pernas e outros ferimentos graves.
"Fui atingido no braço e na perna, meu amigo foi ferido no estômago", disse Momen Mohammad, 31.
Mais cedo, aviões lançaram ao menos cinco novos ataques aéreos perto de uma posição rebelde em Ras Lanuf, um deles atingindo uma casa em uma área residencial. Nenhum dos ataques parecem ter causado mortes, sugerindo que talvez eles tivessem a intenção de intimidar os rebeldes, de acordo com um repórter da agência de notícias Associated Press que presenciou os ataques.
Os rebeldes parecem ter chegado em um ponto de sua campanha em que têm que descobrir como organizar linhas de suprimentos e evitar se tornar alvos fáceis para aviões em suas marchas.
Em Benghazi, a segunda maior cidade líbia e principal fortaleza rebelde, houve um ataque incomum após semanas de calma que se seguiram à captura do território pelos opositores. Homens em um carro jogaram uma granada contra um hotel no qual jornalistas estrangeiros estão hospedados, mas não houve vítimas --apenas pequenos danos em janelas.

DIPLOMACIA
 
No campo diplomático, o presidente dos EUA, Barack Obama, e o premiê do Reino Unido, David Cameron, concordaram em planejar um "completo espectro de possíveis respostas" à Líbia, incluindo um embargo de armas e a imposição de uma zona de exclusão aérea no país.
A Casa Branca enfatizou a expressão "completo espectro de respostas" em um comunicado sobre a conversa telefônica entre os dois líderes nesta terça-feira, destacando o potencial de uma resposta militar dos EUA e de seus aliados da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) enquanto a Líbia dá sinais de ir em direção a uma guerra civil.
O comunicado diz que Obama e Cameron concordaram que o objetivo deve ser acabar com a violência e a saída do ditador Gaddafi "o mais rápido possível".
Os dois "concordaram em prosseguir com o planejamento, incluindo na Otan, de um completo espectro de possíveis respostas, incluindo vigilância, assistência humanitária, aplicação do embargo de armas e uma zona de exclusão aérea", diz o texto.
Impor uma zona de exclusão aérea provavelmente envolve um complexo comprometimento do poderio militar americano, mas cada vez mais pedidos por isso tem sido feitos, já que forças leais a Gaddafi atacam rebeldes com ataques aéreos.
As estimativas de mortes variam de centenas a milhares.
Os principais conselheiros de segurança nacional de Obama irão se reunir nesta quarta-feira para delinear quais ações são realistas e possíveis para pressionar Gaddafi a acabar com a violência e deixar o poder, disseram autoridades.
A reunião, que será realizada na Casa Branca, irá examinar as ramificações de uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia e potenciais opções militares, apesar de a decisão final ficar com Obama, de acordo com as fontes, que falaram sob condição de anonimato.
A secretária de Estado, Hillary Clinton, o conselheiro de Segunda Nacional, Tom Donilo, e o chefe da CIA (agência de inteligência americana), Leon Panetta, estão entre os que devem participar das discussões.
Nesta terça, em entrevista a uma emissora de TV, Hillary afirmou que qualquer imposição de uma zona de exclusão aérea na Líbia deve ter apoio internacional e não ser um esforço liderado pelos Estados Unidos.
"Queremos ver a comunidade internacional apoiar isso", afirmou à Sky News quando questionada sobre o tema. "Acredito que é muito importante que isso não seja um esforço liderado pelos EUA porque isso vem do próprio povo da Líbia. Isso não veio de fora, isso não veio de alguma potência ocidental ou algum país do golfo dizendo 'Isso é o que você deve fazer'."
Forças leais ao ditador líbio estão tentando acabar com uma revolta contra o regime do mandatário, que já dura 42 anos. Hillary disse que a crise pode ser demorada.
"Pedimos ao coronel Gaddafi para sair. Acreditamos que ele totalmente perdeu qualquer legitimidade ao poder. Quando um líder se vira contra seu próprio povo, isso é o fim. Mas sabemos que há uma longa estrada pela frente para ser capaz de tentar resolver isso."
"Gostaríamos de ver isso [a crise líbia] resolvida pacificamente. Gostaríamos de vê-lo [Gaddafi] ir pacificamente. Gostaríamos de ver um novo governo chegar pacificamente", afirmou a chefe da diplomacia americana. 
"Mas isso não é possível. Então, vamos trabalhar com a comunidade internacional. Agora há países que não concordam com isso e eu acho que é importante que a ONU [Organização das Nações Unidas] tomasse essa decisão, não os EUA."
O Reino Unido e a França estão trabalhando no Conselho de Segurança da ONU em uma resolução para estabelecer uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia que poderia ser aplicada, caso as condições pedissem por isso.
Mas aliados ocidentais aparentam estar divididos sobre o tema. Há dúvidas também se China e Rússia apoiariam a decisão. 

REUNIÃO COM A OPOSIÇÃO
 
Funcionários do governo americano, entre eles o embaixador dos EUA na Líbia, Gene Cretz, se reuniram nos últimos dias com integrantes do Conselho Nacional de Transição liderado pela oposição no país do norte da África, informou nesta terça-feira o Departamento de Estado.
As reuniões, que ocorreram no Cairo (Egito) e em Roma (Itália), foram as primeiras feitas com os EUA desde que o órgão opositor foi constituído com o objetivo de derrubar o ditador Muammar Gaddafi.
O porta-voz do Departamento de Estado, Philip Crowley, não quis identificar as pessoas que mantiveram conversas com Cretz e assegurou que o objetivo dos encontros foi 'conseguir um maior entendimento do que está ocorrendo' no país árabe.
"Cretz se reuniu nos últimos dias com funcionários do governo da Itália e do Egito, mas também com membros da oposição da Líbia", disse Crowley em sua entrevista coletiva diária.
Até agora, o Departamento de Estado tinha mostrado interesse em lidar com o movimento opositor no país, mas ao mesmo tempo se mostrava cético sobre sua organização ou a quantidade de apoio com que contavam na Líbia.
Em relação a isso, Crowley apontou que não corresponde aos EUA "escolher os protagonistas neste esforço" de transição, por isso tentam se relacionar com "uma ampla categoria de líderes e de pessoas que podem influir nos eventos na Líbia", incluindo opositores que não pertencem ao Conselho Nacional de Transição.
"Estamos contatando uma ampla variedade de líderes, aqueles que entendem e que podem potencialmente influenciar nos eventos na Líbia", disse à imprensa o porta-voz do Departamento de Estado, Philip Crowley.
O Conselho Nacional de Transição, com sede em Benghazi, é liderado pelo ex-ministro da Justiça da Líbia Mustafa Abdul Khalil, que desertou do regime após o início da violenta repressão contra opositores de Gaddafi.
Crowley indicou, além disso, que o Ministro de Relações Exteriores da Líbia, Moussa Koussa, ligou para o secretário adjunto de Estado para Assuntos de Oriente Médio, Jeffrey Feltman, para falar sobre "a situação na Líbia do ponto de vista do regime de Gaddafi", em uma conversa "muito breve".
Os EUA continuam com sua missão humanitária na fronteira entre Líbia e Tunísia, na qual investiram US$ 30 milhões para comprar material, garantir serviços básicos de emergência e transportar cidadãos aos seus países. 

APÓS RUMORES, APARIÇÃO FRUSTRANTE
 
Na noite desta terça, Gaddafi dirigiu-se ao hotel na capital, Trípoli, onde estão hospedados os jornalistas estrangeiros que cobrem a revolta no país contra seu regime. A imprensa internacional dizia que o mandatário poderia falar aos repórteres, mas ele deixou o local cerca de uma hora depois sem falar aos repórteres que esperavam por algum tipo de declaração. Segundo a rede de TV americana CNN, o mandatário concedeu uma entrevista apenas a um jornalista turco e, ao final, foi embora.
Gaddafi chegou ao local pouco antes das 23h locais (19h em Brasília) e gerou tumulto entre os jornalistas que tentavam falar com ele, fotografá-lo ou filmá-lo.
No entanto, o ditador não pronunciou nenhuma palavra e seguiu para uma parte do hotel que não foi divulgada. Mas, usando uma túnica negra e um turbante de cor ocre, o coronel levantou os braços e cerrou os punhos em sinal de vitória. 
A "visita" de Gaddafi ocorreu no mesmo dia em que a liderança rebelde --que luta contra forças leais ao ditador pelo controle do país há 21 dias-- disse que, se o ditador renunciar dentro de 72 horas, não irá tentar levá-lo à Justiça.
"Se ele deixar a Líbia imediatamente, durante 72 horas, e parar com o bombardeio, nós, como líbios, iremos recuar de persegui-lo por crimes", disse Mustafa Abdel Jalil, chefe do Conselho Nacional Líbio, à Al Jazeera.
Mais cedo, a emissora de TV americana CNN informou que Gaddafi estaria trabalhando em um acordo para deixar o governo após 41 anos e para isso quer que os rebeldes da oposição garantam passagem segura para fora do país e que nem ele, nem sua família, sejam processados.
Gaddafi teria proposto um encontro do Parlamento líbio para acordar os termos da transição e os passos para sua renúncia. Segundo a TV Al Jazeera, os termos do ditador incluem ainda uma boa quantia em dinheiro.
O ditador teria inclusive enviado o ex-premiê Jadallah Azzouz Talhi para se reunir com os rebeldes e trabalhar na versão final de um acordo, pelo qual ele entregaria o poder a um comitê formado pelo Congresso Geral do Povo.
Mas os rebeldes rejeitaram qualquer oferta de negociação com o líder líbio para que ele deixe e o poder, e o governo afirmou que tais informações são "absolutamente sem sentido".
A jornalistas, membros do conselho disseram que tais conversas não existiram. O porta-voz dos rebeldes, Abdel Hafez Ghoga, também negou relatos de que a oposição teria prometido não tentar levar Gaddafi a julgamento se ele renunciar em três dias.

 Por Folha