Japão detecta radiação na água; mortos no país podem ser mais de 15 mil
O governo japonês anunciou nesta segunda-feira (noite de domingo no Brasil) que detectou um nível de iodo radioativo três vezes superior ao limite legal na água corrente de um povoado situado a 40 quilômetros da central nuclear de Fukushima Daiichi, destacando porém que não há risco para a saúde. A informação foi divulgada um dia depois de a polícia afirmar que o número de mortos apenas na região mais afetada pelo tremor seguido de tsunami do último dia 11 pode passar de 15 mil.
O ministério da Saúde informou que amostras de água da localidade de Iitatemura apresentam 965 becquerel por quilo, bem acima do limite de 300 becquerel por quilo.
Uma pessoa, ao beber um litro de água com o nível de 300 becquerel por quilo, absorve uma quantidade de radiação equivalente à décima quarta parte do que se recebe durante uma viagem de avião entre Tóquio e Nova York, destacou o ministério.
"Não há efeitos imediatos para a saúde se o consumo da água for temporário", declarou o funcionário do ministério Shogo Misawa. "Mas, por precaução, recomendamos que a população evite tomá-la."
A província de Fukushima fornecerá água potável para os 4.000 habitantes da localidade.
Na quinta-feira, foi detectado um nível de 308 becquerel por quilo na água de Kawamata, outro povoado de Fukushima, mas esta taxa caiu a 155 na sexta-feira e a 123 no sábado, informou o ministério.
Alimentos também foram contaminados. Autoridades em Taiwan encontraram neste domingo radiação em uma carga de vagens importada do sul do Japão. A contaminação foi muito pequena e estava dentro dos limites de segurança alimentar estabelecidos pela lei taiwanesa.
A radiação foi encontrada em 14 kg de vagens trazidas de Kagoshima, disse Tsai Shu-chen, funcionária da Administração de Comida e Drogas do país.
Apesar de não oferecer risco à saúde, esta é a primeira notícia de comida importada do Japão com radiação, desde a crise nuclear na usina de Fukushima Daiichi --danificada por um terremoto e tsunami há nove dias.
Tsai disse que as vagens podem ter sido contaminadas quando foram transportadas, de avião, ao Aeroporto Narita, em Tóquio, para uma escala antes da viagem a Taiwan.
Kagoshima, na ponta sudoeste da ilha de Kyushu, está há mais de 1.100 km do epicentro do tremor, localizado na costa leste da ilha de Honshu.
Tsai disse que não há motivo para pânico, já que os testes mostraram que a vagem contem apenas 11 Becquerels (Bq) de iodo e 1 Bq de césio-137 por quilo --ambos bem abaixo dos níveis máximos permitidos.
Ela disse que, por precaução, toda a carga será destruída.
A notícia foi divulgada um dia depois do governo japonês admitir a contaminação por radiação em espinafre procedentes da província de Ibaraki e em quatro amostras de leite na província de Fukushima.
Neste domingo, contudo, o secretário de Gabinete japonês, Yukio Edano, assegurou que o leite e espinafre não chegaram ao mercado. Ele afirmou ainda que continuarão analisando dados e realizando testes para determinar se se deve regular a distribuição de produtos procedentes das zonas próximas à central, algo que poderia se concretizar nesta segunda-feira.
Em todo caso, reiterou que esses achados não representam uma ameaça imediata para os consumidores e lembrou que a detecção de iodo radioativo abaixo dos limites na água de torneira em Tóquio e regiões do norte da capital também não supõem um risco para a saúde.
"Eu estou preocupada, realmente preocupada", disse Mayumi Mizutani, moradora de Tóquio, 58. Ela comparava água mineral para o neto de dois anos. "Nós estamos com medo porque é possível que nosso neto tenha câncer", disse.
VÍTIMAS
Um novo balanço da Polícia Nacional do Japão elevou neste domingo para 8.450 o número de mortes no terremoto e posterior tsunami que atingiram o país no último dia 11. Outras 12.931 pessoas ainda estão desaparecidas.
No entanto, apenas na província de Miyagi --a mais atingida pelo desastre--, o número de mortos pode ultrapassar os 15 mil, segundo um chefe de polícia local informou.
Cerca de 360 mil pessoas em toda a costa nordeste do país tiveram de abandonar suas casas, e 26 mil foram resgatadas.
Neste domingo, equipes de resgate japonesas encontraram uma avó e seu neto debaixo dos escombros de uma casa onde estavam presos há nove dias, após o terremoto de magnitude 9 --seguido de tsunami.
Sumi Abe, 80, e Jin Abe, 16, tiveram a sorte de estar na cozinha quando a casa desmoronou em 11 de março. Eles sobreviveram comendo tudo o que tinham na geladeira, sobretudo iogurtes.
Agora, os esforços se centram em procurar um lar para os sobreviventes que perderam suas casas. Cerca de 355 mil pessoas continuam em abrigos improvisados em 15 províncias, incluindo Tóquio.
Este número inclui, segundo a agência de notícias Kyodo, 20 mil moradores de áreas próximas à usina nuclear de Fukushima Daiichi, retirados diante do vazamento de radiação. Eles foram levados para sete outras prefeituras, entre elas Niigata, Yamagata e Tochigi.
"Os corpos levados pelo tsunami serão recuperados aos milhares todos os dias a partir de agora", disse o chefe de polícia de Miyagi, Naoto Takeuchi.
Na cidade de Otsuchi, em Iwate, o prefeito Koki Kato foi encontrado morto neste sábado. Ele estava desaparecido desde o tsunami, quando realizava uma reunião de emergência.
USINA
O estado da usina de Fukushima continua sendo muito preocupante.
O governo anunciou que a central deixará de funcionar. Se a operadora privada Tokyo Electric Power (Tepco) ratificar essa decisão, Fukushima se tornaria a maior ruína nuclear do mundo, à frente de Tchernobil, que tinha quatro reatores quando ocorreu o acidente, em 1986.
Mas não se pode deixar o local abandonado, já que a ausência de eletricidade provocaria um aquecimento do combustível utilizado, sua fusão e uma contaminação ambiental.
Para tentar restabelecer o fornecimento elétrico, os socorristas tiveram de interromper suas operações de refrigeração com jatos de água, que tinham se intensificado desde sábado.
"A pressão no interior do recinto de confinamento do reator 3 aumenta", declarou um responsável da agência de segurança nacional.
Ao anoitecer, ainda não tinha sido restabelecida a corrente elétrica para colocar em funcionamento as máquinas que bombeiam água no sistema de refrigeração do reator número 2, que é prioritário por estar menos danificado que os 1, 3 e 4.
Os técnicos conseguiram conectar um cabo de alta tensão a um distribuidor. A operação "levará mais tempo". "Não sabemos quando poderemos restabelecer os sistemas", declarou Naohiro Omura, da operadora Tepco.
No raio de 20 km da zona de exclusão em torno da central, voltaram a ser detectados neste domingo níveis anormais de radioatividade no leite e nos espinafres, segundo a agência Kyodo.
Mas as autoridades multiplicaram as mensagens tranquilizadoras.
"Os níveis atuais não apresentam um risco para a saúde", afirma o chefe adjunto do gabinete do primeiro-ministro, Tetsuro Fukuyama.
No nordeste do país, a situação humanitária é delicada para os 400 mil afetados pelo terremoto e tsunami, confrontados com a falta de água corrente e de eletricidade em alguns abrigos.
Por Folha