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Bolsas assombram mundo

Os títulos do Tesouro dos Estados Unidos tiveram a nota rebaixada pela Standard&Poor's, o que indica que aumentou o risco de calote por parte do governo. Mas, por mais estranho que possa parecer, a procura pelos papéis não caiu. O rebaixamento criou tamanha aversão a risco nos mercados que, no fim, investidores fugiram das ações, consideradas de risco, para o ativo que consideravam mais seguro: justamente os Treasuries, como são conhecidos os títulos do governo dos EUA. Com isso, a taxa de retorno dos bônus de dez anos caiu a 2,3% ao ano - seu menor nível desde 2009 -, ante 2,56% registrados no fechamento de sexta-feira, o dia do rebaixamento pela S&P. Quando cai o retorno oferecido por um determinado título significa que subiu a procura pelos papéis, explicam os especialistas. A lógica é a seguinte: com a maior demanda, os investidores têm que pagar mais para conseguir comprar os títulos. Como o gasto é maior, mas a taxa paga pelo governo continua a mesma, cai o ganho total final, ou seja, o retorno do papel. Em 8 de fevereiro, quando as discussões em relação ao endividamento americano ainda não concentravam as atenções do mercado, a taxa bateu o recorde do ano: 3,7%. Ou seja, a procura estava menor e, para comprar o papel, o investidor desembolsava um percentual menor do valor de face.
Quando a crise da dívida europeia começou a se agravar, aconteceu o contrário dos Treasuries. A taxa de retorno dos papéis de Itália, Espanha e Grécia subiu exponencialmente após o rebaixamento do rating destes países.
- Ficou provado que a S&P pode rebaixar para "AA+", mas o fato é que os Treasuries ainda são o ativo mais seguro do mundo - disse ao GLOBO o estrategista-chefe de investimentos do fundo americano Wells Capital, James Paulsen, por telefone ao GLOBO de Minneapolis, nos Estados Unidos.

Analista vê incoerência por parte do mercado 

Para Jason Vieira, analista internacional da corretora Cruzeiro do Sul, foi uma incoerência.
- Se o mercado está assustado com o que a agência falou, não deveria ter mais procura por títulos do Tesouro americano - diz Vieira. - É o resultado de um mercado em pânico que não opera com racionalidade.
Por outro lado, o ex-diretor de política monetária do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas comenta que a procura por títulos do Tesouro americano era esperada, na tentativa de se escapar de ativos de risco.
- Isso já era esperado, porque há uma fuga de ativos de risco. O mercado sabe que não tem alternativas, então foge para o título do Tesouro americano, ainda considerado um porto seguro - diz Freitas.
O Comitê de Mercado Aberto do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) se reúne hoje, e a expectativa é que mantenha a taxa básica do país entre zero e 0,25% ao ano. Também se especula que o Fed indique nova injeção de liquidez na economia por meio de mais uma fase do quantitative easing, programa de recompra de títulos do mercado financeiro.
- O rebaixamento acrescenta mais incerteza ao quadro de crescimento, o que significa que os Treasuries são o que se deve comprar. Agora o mercado vai olhar para o Fed para ver em que pé está - afirma Michael Cheah, da SunAmerica Asset Management, em Nova Jersey.
A taxa de retorno dos Estados Unidos foi a que mais caiu entre os países desenvolvidos com nota de crédito "AAA", mais alto nível de classificação de risco concedido pelas agências internacionais. O rating é usado por investidores para decidir onde aplicar seu dinheiro. Alguns grandes fundos, por exemplo, têm como regra só colocar dinheiro em países e empresas com a nota máxima.
 
Títulos do 'clube AAA' estão abaixo dos Treasuries
 Ainda assim, alguns desses países do "clube do AAA" têm atualmente retornos inferiores aos do governo americano. É o caso de Alemanha (taxa de retorno de 2,25% ao ano), Suécia (2,22%), Hong Kong (1,99%), Cingapura (1,79%) e Suíça (1,10%). Além desses países, só o título de dez anos do Japão tem retorno inferior ao americano (1,10%), apesar de ser um país qualificado como "AA" pela S&P.
O título de dez anos da China, um emergente considerado "AA" pela S&P, fechou ontem com taxa de retorno em queda, a 3,88% ao ano. Já a taxa de retorno para o bônus brasileiro de dez anos, classificado como "BBB", subiu a 3,75% ao ano.
Por estranho que pareça, a procura por títulos do Tesouro dos Estados Unidos não caiu após o rebaixamento do rating da dívida de longo prazo americana, de "AAA" (melhor nota), para "AA+". O rebaixamento criou tamanha aversão a risco nos mercados que, no fim, investidores fugiram das ações, consideradas de risco, e o ativo mais seguro que os investidores identificaram foram os Treasuries, títulos do governo dos EUA.
A taxa de retorno dos bônus de dez anos do Tesouro americano caiu a 2,31% ao ano, ante 2,56% registrados no fechamento de sexta-feira, o dia do rebaixamento pela Standard and Poor's. Seis meses antes, em 8 de fevereiro, a taxa batia o recorde do ano: 3,73%.
Quando cai o retorno oferecido por um determinado título de dívida, é porque subiu a procura, explicam os especialistas. A lógica é a seguinte: com a maior procura, o valor em dólares pago pelos investidores para comprar os títulos subiu. Como o gasto é maior, o retorno do papel cai, já que diminui também a diferença para os juros anuais pagos pelo governo americano
A incoerência é que o rebaixamento da dívida americana feito pela S&P deveria significar aos investidores que cresceu a chance de calote pelo Tesouro. Ou seja, sinal para os investidores pularem fora e alta de juros, como aconteceu nos países europeus endividados quando a taxa de retorno subiu exponencialmente após o rebaixamento do rating de Itália, Espanha e Grécia. Mas não foi isso que os investidores acharam no fim das contas.
- Ficou provado que a S&P pode rebaixar para 'AA+', mas o fato é que ainda é o ativo mais seguro do mundo - disse ao GLOBO o estrategista-chefe de investimentos do fundo americano Wells Capital, James Paulsen.
É incoerente também que logo os títulos do Tesouro tenham virado o porto seguro dos investidores no dia em que os mercados entraram em pânico justamente porque esses ativos foram rebaixados pela S&P.
O rebaixamento estressou os investidores, como se fosse o prenúncio de uma crise de confiança na economia americana.
- O fato de todo mundo ter corrido para títulos do Tesouro mostra que o mercado não deu muita bola para o rebaixamento - declarou Paulsen por telefone de Minneapolis, nos Estados Unidos.
No Brasil - onde o Ibovespa, índice de referência do mercado, tombou 8,09%, e o principal investidor de títulos do Tesouro americano é o Banco Central - a procura por títulos foi considerada irracional.
- O estranho é que, se o mercado está assustado com o que a agência falou, não deveria ter mais procura por títulos do Tesouro americano - diz Jason Vieira, analista internacional da corretora Cruzeiro do Sul. - Essa é a grande incoerência.
Ele diz que essa procura por Treasuries é simplesmente fruto de pânico: - É o resultado de um mercado em pânico que não opera com racionalidade.
Por outro lado, o ex-diretor de política monetária do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas diz que a procura por títulos do Tesouro americano era esperada, na tentativa de se escapar de ativos de risco.
- Isso já era esperado, porque há uma fuga de ativos de risco. O mercado sabe que não tem alternativas, então foge para o título do Tesouro americano, ainda considerado um porto seguro - diz Freitas.
A taxa de retorno dos Estados Unidos foi a que mais caiu entre os países desenvolvidos com "AAA" para esse tipo de papel. Mas, ainda assim, alguns desses países pagam atualmente retornos inferiores aos do governo americano. É o caso de Alemanha (taxa de retorno de 2,25% ao ano), Suécia (2,22%), Hong Kong (1,99%), Cingapura (1,79%) e Suíça (1,10%). Além desses países, só o título de dez anos do Japão tem retorno inferior ao americano (1,10%), apesar de ser um país qualificado como "AA" pela S&P.
O título de dez anos da China, um emergente considerado "AA" pela S&P, fechou com taxa de retorno em queda, a 3,88% ao ano. Já a taxa de retorno para o bônus brasileiro de dez anos, classificado como "BBB", subiu a 3,75% ao ano.

Por O Globo