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Ocupação da Rocinha será às 4h da manhã de domingo

Às 4 horas da manhã do domingo (13) terminará o longo reinado do tráfico na maior favela do país, a Rocinha. O horário foi antecipado a ÉPOCA pelo secretário de Segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame. Dois dias depois da prisão do traficante Nem, o antigo chefe do tráfico na região, Beltrame afirmou que a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha terá entre 800 e 1.000 policiais. Apesar do início da operação bem sucedido, Beltrame ainda não comemora. “Está muito cedo para falarmos em sucesso. Eu acho que há mais preocupação do que satisfação.” A seguir, a íntegra da entrevista do secretário:

ÉPOCA – É verdade que o Nem vinha negociando rendição em condições de não ser julgado por homicídio ?
José Mariano Beltrame –
Não! O que existe a respeito desse traficante é que, desde a tomada do Alemão e da Vila Cruzeiro, no ano passado, pessoas ligadas a algumas igrejas, advogados e policiais vêm com informações muito esparsas de que ele queria se render. Isso nunca se tornou claro e, de mais a mais, rendição é um ato voluntário . Não se rende sob condição. A pessoa chega e se apresenta à autoridade policial, ou em algum lugar onde haja autoridade policial. Portanto, não há negociação em rendição ou muito menos no que diz respeito a suprimir algum tipo de crime contra a vida.

ÉPOCA – A prisão do traficante adiantou a operação de ocupação da Rocinha?
Beltrame – 
Não! Ela está dentro de uma esteira de ações de uma operação combinada, que formou um círculo muito amplo junto às facções da ADA (Amigos dos Amigos), que começou no dia 3 de novembro e veio desencadear na prisão desse bandido. Na última sexta (11), às onze da manhã, na última reunião de briefing que fizemos, estabelecemos que vamos entrar na Rocinha às 4 horas da manhã do próximo domingo (13). Gostaria de destacar que essa operação tem como característica a ação integrada de várias forças das esferas federal, estadual e municipal. As vaidades foram postas de lado em prol de um objetivo comum: a reconquista da Rocinha pelo Estado, um território que estava nas mãos de bandidos. Sem o apoio do Ministério da Defesa, da Marinha, do Exército, da Polícia Federal, da PM e da Polícia Civil, de instituições estaduais e da Prefeitura, seria muito mais difícil fazer essa ocupação.

ÉPOCA – O senhor espera que o Nem possa colaborar com a secretaria, já que tem muitas informações?Beltrame – Gostaria muito que ele colaborasse não só com a segurança, mas com a Justiça do Estado. Acho que seria muito bom que ele pudesse nos apresentar algumas notícias, alguns nortes, para que a gente pudesse intensificar as investigações mais específicas. Esta é minha vontade e acho que de toda polícia e da população fluminense.

ÉPOCA – O que fazer para que Nem não seja assassinado e não conte o que sabe?Beltrame – Ele está muito seguro em Bangu, no regime RDD (Regime Disciplinar Diferenciado, no qual o preso passa 22 horas na cela isolado e só sai para banho de sol duas horas por dia). Acredito, espero que isso não aconteça, mas, neste momento, a responsabilidade é do serviço penitenciário.

ÉPOCA – Existem informações de que os bandidos estão fugindo para Zona Oeste e Baixada Fluminense. É verdade?Beltrame – Algumas informações que temos mostram um movimento para a Zona Oeste, para a área da Vila Vintém. Nesta sexta, a polícia fez uma operação por lá e conseguiu capturar dez pessoas. O que a inteligência tiver, que demonstre migração para qualquer área da cidade, a gente vai procurar antecipar com essas ações. Na verdade, já estamos fazendo isso desde o princípio do mês, com essa ação de cerco amplo combinada entre as polícias Civil, Militar, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal.

ÉPOCA – O que acontecerá com Coelho e com os policiais e os ex-policiais presos?Beltrame – Eles vão ter que prestar explicações ao poder judiciário, ao Ministério Público. Espero que haja uma condenação exemplar para essas pessoas.

ÉPOCA – O senhor pretende investigar a prisão do Nem ou está satisfeito com a versão apresentada?Beltrame – Este tipo de informação está sendo esclarecida pela Polícia Civil. Nós temos que compor a cronologia desses fatos e, se ficar comprovado que é ilógico, que não há lógica nessa sequência, aí a gente parte para uma investigação. Mas nesta sexta, por prevenção e transparência e com o objetivo de montar o que aconteceu, essas pessoas foram ouvidas pela Corregedoria Interna de Polícia.

ÉPOCA – Há expectativa de tempo de ocupação da Rocinha até entrada da UPP? Três meses seria factível ? O Exército ajudará o Bope? Quantos policiais serão utilizados? Serão os mesmos 2 mil do alemão?Beltrame – A UPP da Rocinha prevê aproximadamente mil homens. O planejamento inicial foi em torno de 800 homens, mas vamos trabalhar com a possibilidade de usar mil policiais. O Exército não está nesta ação da Rocinha, mas a gente tem a sinalização do Ministério da Defesa de que, se fazendo necessário, o governador Sérgio Cabral demandaria isso ao Ministério da Defesa. Assim, a possibilidade de que tenhamos a participação do Ministério da Defesa, por meio do Exército, é possível.

ÉPOCA – O senhor deve estar se sentindo orgulhoso ao perceber que a autoridade da política de pacificação está se impondo sobre comunidades dominadas. Há mais preocupação do que satisfação? O senhor não deu um sorriso durante as entrevistas na TV.Beltrame – Eu acho que há mais preocupação do que satisfação. O problema aqui é grande, por ser antigo, a gente avança. Acho que estamos caminhando, mas tem ainda que seguir, ainda está muito cedo para falar em sucesso ou sorrir.

ÉPOCA – O senhor havia feito promessa de que o Nem não comeria o peru de Natal solto na Rocinha neste ano, quando foi decidida a ocupação?Beltrame – A ocupação já faz parte do planejamento formado há dois anos. Nós já sabíamos, quando fizemos a ocupação da Mangueira (junho deste ano) que a Rocinha seria a próxima. Faltava uma data. Quando estávamos na metade de ocupação da Mangueira, decidimos que era hora de fazer a Rocinha . E fizemos esse planejamento, que foi diferente de qualquer outro, porque todas as UPPs são diferentes. Não quer dizer que vamos usar o mesmo método na próxima UPP. Na Rocinha, pela maneira que a ADA trabalha, a gente agiu dessa forma.

Por Época