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STF analisa desde 2005 jogo que beneficiaria Cachoeira

Uma ação iniciada pelo Ministério Público de Goiás tramita desde 2005 no Supremo Tribunal Federal (STF) tentando anular lei daquele estado que autoriza a exploração de loterias instantâneas. Naquele ano, chegou ao ministro Cezar Peluso, que, como relator escolhido para o caso, deixou o processo parado por cinco anos, até que ele foi redistribuído e caiu nas mãos do ministro Gilmar Mendes - que mandou arquivar a ação do MP. Sem entrar no mérito sobre a validade ou não da legislação estadual, Gilmar tomou a decisão com base em falhas processuais. A lei e o decreto que regulamentou essa norma foram assinados, em 2000, pelo então governador Marconi Perillo (PSDB), eleito para novo mandato em 2010. A legislação abria brecha para que o governo contratasse empresa para explorar até mesmo caça-níqueis, segundo promotores. A principal beneficiada seria a empresa Gerplan, que pertencia ao contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
Apesar da lei aprovada e do decreto assinado, Marconi Perillo não levou adiante a exploração das loterias instantâneas. O governo de Goiás argumenta que não pôs a norma em prática por recomendação dos próprios promotores, que advertiam sobre a existência de brecha na lei para a exploração de caça-níqueis. Ainda assim, o processo judicial se arrasta até hoje, e, agora, a Advocacia Geral da União (AGU) pede ao ministro Gilmar Mendes que reconsidere a decisão.

AGU diz que houve fraude processual

A Gerplan - Gerenciamento e Planejamento Ltda. é citada em relatório da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, como uma das empresas que serviam às atividades de Carlinhos Cachoeira, preso desde 29 de fevereiro sob a acusação de liderar esquema de exploração de jogos de azar em Goiás. De acordo com o relatório da PF, a Gerplan já está desativada. O artigo 4º do decreto 5.282 prevê que, entre as modalidades de loteria que poderiam ser exploradas em Goiás, estava a loteria de terminal ou videoloteria, “que consiste na utilização de equipamento ou terminal de apostas, dotado de vídeo, capaz de demonstrar o resultado de combinação de números, palavras, símbolos ou figuras”.
A polêmica foi parar no STF em 2005, depois que o MP recorreu ao Tribunal de Justiça de Goiás para questionar decisão da primeira instância, que, em 2002, considerou válida a norma editada por Perillo. E só subiu ao STF porque a AGU entrou como parte interessada, uma vez que a Constituição permite exclusivamente à União legislar sobre a exploração de loterias. Em 2007, a Suprema Corte reforçou a lei, ao julgar procedente Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pelo mesmo MP de Goiás, contra todas as leis estaduais que versavam sobre jogos.
Em 2010, cinco anos após chegar ao STF, o relator da ação, ministro Cezar Peluso, assumiu a presidência da Corte. O processo foi redistribuído, então, ao ministro Gilmar Mendes. O processo passou mais de um ano com o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Ele recebeu os autos em abril de 2010 e os devolveu ao STF em dezembro do ano seguinte.
Em 2 de fevereiro deste ano, Gilmar Mendes arquivou a ação ao encontrar um erro processual do MP, que os promotores não reconhecem. Em sua decisão, o ministro do STF explica que o Ministério Público perdeu o prazo para recorrer da decisão de primeira instância. O Ministério Público foi intimado da sentença em 20 de agosto de 2002, e teria 30 dias para apresentar o recurso, carimbado no protocolo em 25 de setembro. Teoricamente, o prazo venceu.
“Verifico que o recorrente foi intimado da sentença em 20 de agosto de 2002, conforme a certidão de folhas 622. No carimbo de protocolo do recurso, no entanto, consta a data de 25 de setembro de 2002, posterior ao término do prazo de 30 dias. (...) Notório, portanto, a intempestividade do recurso, tendo a sentença transitado em julgado”, afirma o ministro Gilmar Mendes na decisão.
Mas o Ministério Público e o advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, argumentam que houve erro ou fraude processual, no âmbito da Justiça de Goiás. No agravo, encaminhado ao ministro Gilmar Mendes, em fevereiro, a AGU afirma que a ação do MP já justificava a presumida perda de prazo.
A ação relata que o recurso teria sido impetrado em 19 de agosto de 2002, portanto, no prazo regimental. A AGU reproduziu cópia do recibo manuscrito, assinado por um servidor do cartório identificado apenas como “Wilson”, com a data de 19 de setembro daquele ano. E alega que o argumento da perda de prazo é “inverídico”.
“Assim, demonstrando o equívoco/falsidade da certidão que ensejou a decisão ora recorrida, merece ser provido o presente agravo, julgando-se tempestiva a apelação interposta pelo MP/GO. Caso assim não entenda, requer que o feito seja conduzido ao plenário do STF, de maneira que o presente agravo seja provido”, conclui a AGU, em agravo assinado por Adams e os advogados Grace Fernandes Mendonça e Alisson da Cunha Almeida.
O governo de Goiás assegura que não há exploração da loteria instantânea, apesar do arquivamento da ação do MP.
A assessoria de imprensa do Supremo Tribunal Federal informou que o ministro Gilmar Mendes terá que decidir sobre o caso, por isso, não pode se pronunciar fora dos autos. A AGU também se limitou a confirmar que atua no caso e que defende os argumentos presentes na ação.

Por O Globo