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Investigada por desvios, Delta ainda cobra R$ 1 bi de governos

Presidente-tampão da Delta, o engenheiro Carlos Alberto Verdini afirmou nesta quarta-feira que a construtora, envolvida no escândalo Cachoeira, tem “direito adquirido” sobre os contratos já assinados com o poder público. Ocupando o lugar de Fernando Cavendish, que se retirou do comando para negociar a transição, Verdini diz que, caso a Delta seja considerada inidônea pelo Tribunal de Contas da União, seria “legítimo” ajuizar uma ação judicial. Ele disse, no entanto, não acreditar que isso acontecerá. Segundo ele, a empresa, que tem hoje R$ 4,5 bilhões em 200 contratos com União, estados e municípios, é credora de R$ 900 milhões nesses contratos. Verdini relutou em falar sobre a operação de venda da Delta para a J&F Holding.

O GLOBO: Como os governos federal, estadual e municipais, que são clientes da Delta, estão se comportando diante das denúncias que pesam sobre a empreiteira?
CARLOS ALBERTO VERDINI: Alguns deram uma parada para fazer auditagem e já estão começando a pagar. Não temos medo de auditagem. Todos os contratos são fiscalizados. O cliente é obrigado a fiscalizar. E as concorrências foram feitas. Uma questão é que, como fizeram um estardalhaço, cria um certo receio na conjuntura atual; quem está com a caneta, na hora de dar a canetada final, fica com medo.

A CGU pode declarar a empresa inidônea. Como o senhor vê isso?
VERDINI: Estamos fazendo um trabalho para levar à Casa Civil, mostrando nossa defesa. Uma coisa é: uma estrada depois de feita ficou com um buraco. É preciso saber se foi mal executado ou se foi erro de projeto: 99% são erro de projeto. Porque tudo é feito em cima de projeto básico. Agora é que o Dnit, em função da troca de diretoria, declarou que todos os projetos serão feitos em cima de projetos executivos. O projeto executivo leva um ano, no mínimo, para ser feito. E a responsabilidade é do gestor. Quando a gente entra na concorrência, executa o projeto que é oferecido ali.

O senhor teme que a CGU decida pela inidoneidade da Delta?
VERDINI: Essa hipótese não passa na minha cabeça. Primeiro, porque somos muito grandes. Você não pode tirar da Delta e dar a qualquer um. É direito adquirido. Primeiro, tem de gerar um momento para rescisão. Tem de fazer o encontro de contas. E depois vai ter de licitar. Esse processo é demorado. Tenho certeza de que, ao licitar, você vai contratar por um preço mais alto do que é praticado hoje. E as obras vão ficar paradas. Vai atrasar todos os cronogramas. Não é uma coisa fácil de ser executada. É direito adquirido da Delta. Nós ganhamos as licitações. Você vai ter de provar que estou errado para rescindir meu contrato. Eu posso ir para a Justiça e dizer: “eu não concordo”. E vai ficar uma discussão até chegar a um determinado fim, para então licitar aquela licitação específica.

Estamos falando de que universo de contratos? E de que valores?
VERDINI: Estamos tocando hoje 200 contratos, em 25 estados. O saldo desses contratos hoje é de R$ 4,7 bilhões. Temos a receber hoje R$ 900 milhões, sendo R$ 450 milhões já no caixa. E R$ 450 milhões em tramitação de medição e faturamento. Isso em todas as esferas de governo.

Como o senhor viu o envolvimento do seu nome com o dos homens do contraventor Carlinhos Cachoeira?
VERDINI: Dizer que tenho relacionamento com uma pessoa que tenta falar comigo e não fala, e que diz que tenho uma amizadezinha... Isso é perder tempo. Eu o conheci (o ex-sargento da Aeronáutica Idalberto Araujo, o Dadá, flagrado em escuta da PF citando o empresário) quando fui ao escritório de Brasília. Estava cuidando do projeto do trem- bala e precisei ir a Brasília. No escritório, o Claudio Abreu estava com ele e me apresentou. Morreu o assunto. Naturalmente, devia estar querendo, como diz lá (na escuta da PF), queria contratar uma empresa e me procurou para ver se eu ajudava. Ele não falou comigo. E eu não retornei a ligação.

O senhor conhecia o Claudio Abreu? Foi surpreendido com a série de denúncias contra ele?
VERDINI: Ele trabalhava na empresa. Todo mundo ficou surpreso. Foi surpresa geral porque ele era uma pessoa trabalhadora e idolatrava a empresa. A Delta em primeiro lugar. Ele colava nas paredes o slogan “ame-a ou deixe-a”.

E se o senhor for convocado à CPI?
VERDINI: Parece que já fizeram um requerimento, mas não tenho medo.

A empreiteira deixou de fazer aportes em obras como a do Maracanã, uma das quais deixou?
VERDINI: Precisávamos preservar o caixa. Nós vinhamos aportando e discutindo, mas chegou o momento em que resolvemos de vez o assunto. Tanto que ainda temos dinheiro a receber pelo serviço executado. Em torno de R$ 40 milhões. Executamos os serviços juntos e cada um tem a sua parcela. E a nossa parcela era 30%.

E qual é a participação do dono, Fernando Cavendish, na empresa? Não no processo de venda, já que o senhor prefere não falar deste assunto. Mas qual o papel dele no cotidiano da empresa? Ele está afastado?
VERDINI: Totalmente afastado. Foi uma decisão que se tomou para que não houvesse interferência na auditoria que está sendo feita. Isso mostra, ao mesmo tempo, que nós atuamos na própria carne de pronto. Afastamos outros diretores envolvidos.

Mas acontece um afastamento do próprio dono da empresa?
VERDINI: Mostramos que seria melhor para ele e para nós que ele se afastasse. Porque hoje, infelizmente, coitado, ele está sendo tratado como persona non grata, com vários adjetivos. Como é que ele vai chegar a dizer: minha empresa não é assim, não fiz isso, não fiz aquilo. Foi fruto de muita discussão. E infelizmente me escolheram.

Há quanto tempo o senhor está na empresa?
VERDINI: Estou há nove anos na Delta. Trabalhei 14 anos na Queiroz Galvão e 13 na Camargo Corrêa. Trabalhei ainda um ano na Embratel, no início da carreira. Mas, é como se diz, tem que assumir. Não devo nada a ninguém. Não tenho medo de assumir desafios. E, modéstia à parte, acho que tenho competência para poder tocar a empresa. Tenho certeza de que vamos sair dessa, até para melhor.

O resultado dessa auditoria no Centro-Oeste...
VERDINI: Olha, estamos fazendo auditoria no Centro-Oeste e no país inteiro. Estamos fazendo dois tipos de auditoria. Uma para apurar o fato e outra interna, financeira. Isso vai ser encaminhado para a CPI porque é o que vai dizer de fato o que aconteceu. Até agora, todo mundo só fala, fala, fala, fala, mas não tem nada de concreto.

Mas mesmo se a empresa for vendida? Muda alguma coisa nas decisões?
VERDINI: Não sei te dizer. Não sou eu que estou participando. Se eu tivesse participando, diria com o maior prazer. Até para explicar para dentro, pois está todo mundo me perguntando. Mas essa é uma decisão do acionista que tem que ser respeitada.

O senhor falou de direitos adquiridos de qualquer empreiteira com contratos com o poder público, e que a declaração de idoneidade não é uma coisa simples...
VERDINI: É. Tem que ter um processo, ele é demorado. E outra coisa: não é simplesmente dizer que você está inidôneo. Você pode pode afirmar isso pelo fato x, mas eu tenho direito de me defender, de provar que eu estou certo.

O senhor está dizendo que, em tese, isso pode resultar em uma ação judicial?
VERDINI: Claro. Porque é legítimo. Isso é normal. Você tem o direito de defesa em qualquer circunstância.

Por O Globo