Lojas burlam lei e vendem agrotóxicos sem receita
O caminho que leva ao uso indiscriminado dos agrotóxicos nas lavouras
começa nos balcões das empresas especializadas na venda ou mesmo no
comércio clandestino desses produtos, que passaram a entrar no Rio por
intermédio de ambulantes que trazem os venenos pela divisa de Minas e
Espírito Santo e entregam diretamente nas propriedades rurais. No caso
das lojas, apesar de a legislação exigir um receituário agronômico para a
venda, os produtos são normalmente comprados sem qualquer indicação de
um profissional. É o que mostra a segunda reportagem da série “Veneno em
doses diárias”.
Repórteres do GLOBO estiveram em quatro grandes lojas que comercializam o produto e, em três delas — Cia. do Produtor, Comercial Friburguense e Casa Progresso — conseguiram adquirir herbicidas e fungicidas de alta e média toxidade, sem ter prescrição de um agrônomo e sem nota fiscal. Nesta última, no Centro do Rio, uma profissional da própria loja assinou um receituário na hora da venda — prática comum, mas irregular, uma vez que a emissão da receita pressupõe que a propriedade foi visitada pelo agrônomo. Nas outras duas, em Teresópolis, sequer houve a necessidade do documento para retirar os produtos. Comerciantes ouvidos chegaram a afirmar que, se a legislação fosse cumprida à risca, as lojas teriam que fechar as portas.
— O pequeno agricultor não tem como pagar pela consultoria de um agrônomo, e o estado não consegue atender a todos. Então, a maior parte dos agricultores chega aqui sem receita mesmo. Temos um agrônomo para atender aos nossos clientes, mas se ele ficar na loja para assinar todas as receitas, não consegue fazer seu trabalho de campo. A legislação deveria considerar essa realidade — justifica um comerciante.
Em meio a uma pequena propriedade na Zona Rural de Teresópolis, Wineston Machado, de 26 anos, é um exemplo do que diz o comerciante. Flagrado aplicando herbicida na plantação sem qualquer proteção, admitiu:
— Atestado? O balconista é que explica como usar o “mata mato”.
Órgão responsável pela fiscalização do comércio de agrotóxico, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) admite que há venda sem receituário de um agrônomo. Gerente de Licenciamento de Agrotóxico e Vetores do órgão, Jussara Ribeiro Nogueira afirma, contudo, que o Inea está informatizando o sistema de controle sobre as 34 lojas autorizadas a atuar no Rio. Ela acrescenta que o órgão já recebeu denúncia da entrada de vendedores de outros estados, sem licença para vender no Rio. No momento, o Inea investiga outra ilegalidade: a armazenagem de agrotóxico em quatro locais clandestinos, longe dos olhos da fiscalização. No ano passado, o órgão apreendeu quatro toneladas de agrotóxicos proibidos no estado, com prazo de validade vencido ou com embalagens em estado de deterioração:
— Infelizmente, essa prática existe. Nós estamos mudando o sistema de fiscalização para coibir a venda sem receituário. Com o novo sistema, saberemos qual é o estoque de cada produto, quem comprou, quem vendeu e quem assinou o receituário.
Professor da Universidade Federal Rural do Rio e diretor do Conselho Regional de Engenheira e Agronomia (Crea-RJ), João Sebastião de Paula Araujo afirma que os casos relatados pelo GLOBO são uma prática na área agrícola do estado, e deixa em aberto em que condições os agricultores vêm aplicando os produtos. Por lei, cabe ao Crea fiscalizar apenas o exercício legal da profissão de agrônomo.
— A reportagem constatou algo que já conhecemos de longa data, que é o uso indiscriminado e abusivo de agrotóxicos. Infelizmente, por determinação legal, não temos como fiscalizar a venda dos produtos, apenas a atuação dos agrônomos, se eles estão receitando produtos corretos e se há necessidade de indicar esse ou aquele produto. Mas hoje é possível comprar sem receituário, sem que nenhum profissional verifique se é necessário ou não aplicar esses produtos na lavoura — diz Araujo.
Apesar das exigências, alguns comerciantes alegam que contratar um agrônomo inviabiliza o negócio. Ouvido pelo GLOBO, um comerciante que preferiu não se identificar diz que, se a legislação permitisse que as receitas fossem assinadas por um técnico agrícola, a situação poderia ser bem diferente, “uma vez que poderia ter mais profissionais à disposição”.
Comerciante diz que emite receituário
Diretor executivo da Associação Nacional de Defesa Vegetal, entidade ligada à indústria dos agrotóxicos, Eduardo Daher reprova a venda sem receituário. Segundo ele, a orientação do profissional ajuda o agricultor a utilizar o produto correto para cada tipo de praga.
O dono da Companhia do Produtor, Ubiraci Fernandes, diz que todas as vendas da sua empresa são feitas mediante emissão de nota fiscal e de receituário próprio, e que iria apurar por que o vendedor não preencheu o documento. Ele diz ainda que tem uma equipe de agrônomos para atender aos clientes e que, na hora da venda, nenhum deles se encontrava na loja. Procurados, os donos da Casa Progresso e da Comercial Friburguense não se manifestaram
Na avaliação do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Agrícola (Sindag), o Rio ainda não pode ser considerado um estado com incidência de contrabando ou venda de agrotóxico falsificados. Nos últimos anos, os maiores registros dessas ocorrências aconteceram no Sul do Brasil, na fronteira com o Uruguai e Paraguai.
— Não temos registro no Rio da venda de produtos contrabandeados ou falsificados. Mas estamos atentos aos possíveis registros. Estamos elaborando um amplo levantamento sobre essa questão no país — afirma Fernando Marini, gerente do Sindag.
Repórteres do GLOBO estiveram em quatro grandes lojas que comercializam o produto e, em três delas — Cia. do Produtor, Comercial Friburguense e Casa Progresso — conseguiram adquirir herbicidas e fungicidas de alta e média toxidade, sem ter prescrição de um agrônomo e sem nota fiscal. Nesta última, no Centro do Rio, uma profissional da própria loja assinou um receituário na hora da venda — prática comum, mas irregular, uma vez que a emissão da receita pressupõe que a propriedade foi visitada pelo agrônomo. Nas outras duas, em Teresópolis, sequer houve a necessidade do documento para retirar os produtos. Comerciantes ouvidos chegaram a afirmar que, se a legislação fosse cumprida à risca, as lojas teriam que fechar as portas.
— O pequeno agricultor não tem como pagar pela consultoria de um agrônomo, e o estado não consegue atender a todos. Então, a maior parte dos agricultores chega aqui sem receita mesmo. Temos um agrônomo para atender aos nossos clientes, mas se ele ficar na loja para assinar todas as receitas, não consegue fazer seu trabalho de campo. A legislação deveria considerar essa realidade — justifica um comerciante.
Em meio a uma pequena propriedade na Zona Rural de Teresópolis, Wineston Machado, de 26 anos, é um exemplo do que diz o comerciante. Flagrado aplicando herbicida na plantação sem qualquer proteção, admitiu:
— Atestado? O balconista é que explica como usar o “mata mato”.
Órgão responsável pela fiscalização do comércio de agrotóxico, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) admite que há venda sem receituário de um agrônomo. Gerente de Licenciamento de Agrotóxico e Vetores do órgão, Jussara Ribeiro Nogueira afirma, contudo, que o Inea está informatizando o sistema de controle sobre as 34 lojas autorizadas a atuar no Rio. Ela acrescenta que o órgão já recebeu denúncia da entrada de vendedores de outros estados, sem licença para vender no Rio. No momento, o Inea investiga outra ilegalidade: a armazenagem de agrotóxico em quatro locais clandestinos, longe dos olhos da fiscalização. No ano passado, o órgão apreendeu quatro toneladas de agrotóxicos proibidos no estado, com prazo de validade vencido ou com embalagens em estado de deterioração:
— Infelizmente, essa prática existe. Nós estamos mudando o sistema de fiscalização para coibir a venda sem receituário. Com o novo sistema, saberemos qual é o estoque de cada produto, quem comprou, quem vendeu e quem assinou o receituário.
Professor da Universidade Federal Rural do Rio e diretor do Conselho Regional de Engenheira e Agronomia (Crea-RJ), João Sebastião de Paula Araujo afirma que os casos relatados pelo GLOBO são uma prática na área agrícola do estado, e deixa em aberto em que condições os agricultores vêm aplicando os produtos. Por lei, cabe ao Crea fiscalizar apenas o exercício legal da profissão de agrônomo.
— A reportagem constatou algo que já conhecemos de longa data, que é o uso indiscriminado e abusivo de agrotóxicos. Infelizmente, por determinação legal, não temos como fiscalizar a venda dos produtos, apenas a atuação dos agrônomos, se eles estão receitando produtos corretos e se há necessidade de indicar esse ou aquele produto. Mas hoje é possível comprar sem receituário, sem que nenhum profissional verifique se é necessário ou não aplicar esses produtos na lavoura — diz Araujo.
Apesar das exigências, alguns comerciantes alegam que contratar um agrônomo inviabiliza o negócio. Ouvido pelo GLOBO, um comerciante que preferiu não se identificar diz que, se a legislação permitisse que as receitas fossem assinadas por um técnico agrícola, a situação poderia ser bem diferente, “uma vez que poderia ter mais profissionais à disposição”.
Comerciante diz que emite receituário
Diretor executivo da Associação Nacional de Defesa Vegetal, entidade ligada à indústria dos agrotóxicos, Eduardo Daher reprova a venda sem receituário. Segundo ele, a orientação do profissional ajuda o agricultor a utilizar o produto correto para cada tipo de praga.
O dono da Companhia do Produtor, Ubiraci Fernandes, diz que todas as vendas da sua empresa são feitas mediante emissão de nota fiscal e de receituário próprio, e que iria apurar por que o vendedor não preencheu o documento. Ele diz ainda que tem uma equipe de agrônomos para atender aos clientes e que, na hora da venda, nenhum deles se encontrava na loja. Procurados, os donos da Casa Progresso e da Comercial Friburguense não se manifestaram
Na avaliação do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Agrícola (Sindag), o Rio ainda não pode ser considerado um estado com incidência de contrabando ou venda de agrotóxico falsificados. Nos últimos anos, os maiores registros dessas ocorrências aconteceram no Sul do Brasil, na fronteira com o Uruguai e Paraguai.
— Não temos registro no Rio da venda de produtos contrabandeados ou falsificados. Mas estamos atentos aos possíveis registros. Estamos elaborando um amplo levantamento sobre essa questão no país — afirma Fernando Marini, gerente do Sindag.