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Medo toma conta de Trípoli e Kadafi perde controle do leste

Milhares de líbios celebraram a libertação da cidade de Benghazi do controle de Muamar Kadafi, apesar dos rumores de que o ditador teria enviado um avião para fazer um bombardeio contra os manifestantes. De acordo com a imprensa local, a tripulação se ejetou do avião depois da sua decolagem em Trípoli e o aparelho acabou caindo a sudoeste de Benghazi, segunda maior cidade do país. Na capital, moradores estão com medo das próximas atitudes do governo. A repressão dos protestos contra o regime já deixou diversos mortos. Como o acesso às informações no país é difícil, o número de vítimas fatais varia de 640 a 10.000, conforme a fonte que o divulga.
A capital e o restante do oeste líbio continuam sob o domínio de Kadafi. Contudo, moradores da região disseram estar com muito medo de milícias pró-governo e, por isso, evitam sair de casa desde terça-feira, após o discurso em que o ditador voltou a dizer que usaria a violência contra manifestantes.
Autoridades, militares e diplomatas até então leais a Kadafi parecem estar abandonando o ditador, no poder desde 1969. O general Soliman Mahmoud al Obeidy disse à agência de notícias Reuters que Kadafi não é mais confiável. "Tenho certeza de que ele cairá nos próximos dias", afirmou. Um pequeno avião líbio impedido de pousar em Malta nesta quarta levava uma filha do coronel, disse a TV Al Jazira. 
Não há consenso a respeito do número de mortos no conflito. A Federação Internacional para os Direitos Humanos (FIDH), por exemplo, fala, nesta quarta, de pelo menos 640 vítimas - 275 em Trípoli e 230 em Benghazi. O número representa mais que o dobro do balanço oficial do governo líbio de 300 mortos, dos quais 189 seriam civis e outros 111 membros das forças de segurança. 
Ainda menos otimistas são os cálculos do Tribunal Penal Internacional (TPI), para quem os mortos já chegam a 10.000 pessoas e os feridos podem chegar a 50.000. O presidente da Comissão de Justiça e Democracia do TPI, Sayed al Shanuka, disse ainda que "desde que Kadafi chegou ao poder, assassinou milhares de pessoas e também milhares de presos nas próprias cadeias".
O preço do petróleo ultrapassou os 110 dólares por barril nesta quarta-feira, refletindo o receio de que o caos se espalhe para outros países produtores e afete o fornecimento. Mas fontes do setor disseram que petroleiros carregados conseguiram deixar os portos líbios nas últimas 24 horas.

Mercenários - Um oficial da Força Aérea líbia em Benghazi, major Rajib Faytouni, disse ter visto até 4.000 mercenários chegando à cidade, berço da revolta contra Kadafi, em aviões de transporte militar entre os dias 14 e 16 de fevereiro. "Por isso nos voltamos contra o governo. Isso e o fato de que havia uma ordem de usar aviões para atacar pessoas", disse ele ao jornal britânico The Guardian.
Grande parte do leste do país, importante região produtora de petróleo, está agora nas mãos dos rebeldes. Uma prisão vazia estava em chamas em Benghazi, e as pessoas soltavam rojões e buzinavam para celebrar o fim da violência dos últimos dias. O canal britânico Sky News exibiu imagens de mísseis antiaéreos no que disse ser um quartel abandonado perto de Tobruk, também no leste. 

Contra-ataque - Para conter a revolta, Kadafi mobilizou tropas a oeste da capital. O ditador líbio, que já foi muito respeitado pela população do país apesar do seu regime repressor, convocou uma grande manifestação de apoio nesta quarta-feira, mas apenas cerca de 150 pessoas foram à praça Verde, no centro de Trípoli, levando a bandeira líbia e o retrato de Kadafi.
A maioria das ruas esteve quase deserta, e alguns poucos cafés pareciam ser os únicos negócios em funcionamento. "Muita gente está com medo de sair de casa em Trípoli, e atiradores pró-Kadafi estão vagando por aí, ameaçando as pessoas que se reúnem em grupos", disse o tunisiano Marwan Mohammed, que cruzou a fronteira de volta para o seu país.

Reação internacional - Países que mantêm relações comerciais com a Líbia se empenham em retirar seus cidadãos do país, especialmente depois de um trabalhador turco ser morto em uma construção perto da capital, segundo autoridades de Ancara. Estima-se que 1,5 milhão de estrangeiros estejam no território a trabalho ou de passagem, e que um terço da população de 7 milhões seja de imigrantes da África Subsaariana.
O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) condenou o uso da violência e pediu punição aos responsáveis por abusos contra civis. A Grã-Bretanha também disse estar pressionando as autoridades líbias a reabrir um aeroporto militar a fim de ajudar nas retiradas, e propôs uma resolução do Conselho de Segurança que condene mais formalmente a violência.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, está muito preocupado com os cidadãos norte-americanos na Líbia, segundo a Casa Branca, e avalia a possibilidade de tentar promover sanções da ONU a Trípoli. A França se tornou o primeiro país a defender abertamente esse recurso. "Eu gostaria da suspensão das relações econômicas, comerciais e financeiras com a Líbia até segunda ordem", disse o presidente Nicolas Sarkozy.

Por Veja