Central nuclear de Angra vai rever segurança de encostas
RIO - A tragédia na Região Serrana, em que as montanhas escorreram matando quase mil pessoas, tem tanto a ensinar para a melhoria da segurança das usinas atômicas de Angra dos Reis quanto a crise nuclear em Fukushima, no Japão. É que o inimaginável - que, no caso japonês, foi um poderoso terremoto, seguido de uma gigantesca tsunami - também pode ocorrer por aqui, revela reportagem de Carla Rocha e Paulo Motta, publicada pelo Globo neste domingo. De intensidade jamais vista, as chuvas de janeiro mostraram que, no Rio, o risco vem dos deslizamentos. A Eletronuclear, empresa responsável por Angra 1 e 2 e pelas obras de Angra 3, já criou uma comissão para estudar o assunto, e uma consultoria externa será contratada para reavaliar a segurança das encostas no entorno da central.
- Nós estamos sempre monitorando e reavaliando cada trecho de encosta. Às vezes, identificamos a necessidade de fazer uma nova obra ou refazer alguma antiga. Mas os últimos acontecimentos mostraram que o inimaginável pode acontecer. Queremos uma segunda opinião. Não basta nossa certeza, queremos o parecer de pessoas da academia, que podem analisar a questão de forma independente - afirma o gerente de engenharia civil e estruturas metálicas da Eletronuclear, Diógenes Salgado Alves. - Não fabricamos salsicha. O nosso negócio nos obriga a avaliações constantes.
Em 1985, um grande desastre mostrou que o inimaginável não é tão inimaginável assim. Uma enxurrada provocou um gigantesco deslizamento exatamente na face oposta da montanha do local onde está Angra 1, abrindo uma cratera na Rodovia Rio-Santos, soterrando o Laboratório de Radioecologia da Eletronuclear e quase fechando a saída de água da refrigeração da usina. A avalanche destruiu ainda a marina e os barcos de funcionários, formando uma onda tão grande que cobriu uma ilha em frente.
O complexo de usinas de Angra é cercado por montanhas que formam um U. Em frente está o mar. Por baixo da densa cobertura, as rochas são basicamente de granito e gnaisse, e a evolução geomorfológica da região está ligada ao tectonismo terciário, típico da Região Sudeste, com seus patamares escalonados, como degraus sucessivos, que garantem os belos recortes da Serra do Mar. O conhecido histórico de deslizamentos ao longo de toda a Rio-Santos, rodovia que passa pela usina, dá a dimensão do desafio imposto pela natureza do lugar.
No momento, os técnicos da Eletronuclear trabalham em duas intervenções, que parecem cirurgias de alta complexidade. Num pedaço de encosta está sendo feita uma contenção com berma (em que pedras sobrepostas são usadas para melhorar a estabilidade do morro). Tudo porque foi detectada uma movimentação de dois milímetros por mês no local, o que representa pouco mais de dois centímetros por ano. Num outro trecho, antigos tirantes (cabo de aço para prender os muros de concreto à rocha) com sinais de ferrugem estão sendo substituídos. Células de carga, que medem o peso suportado pelos tirantes, foram instaladas para saber se, ao longo dos anos, o que é muito incomum, houve alguma mudança significativa que leve à utilização de um número maior de tirantes. Um preciosismo: milímetro a milímetro, miligrama a miligrama.
- Há oito pontos que foram apontados como mais críticos num grande estudo geotécnico feito em todo o Sítio de Itaorna e que são constantemente vigiados - explica o engenheiro geotécnico José Evaldo Soares, responsável por todo o monitoramento das encostas próximas às usinas.
Por O Globo