|

Senado corre para legalizar a multiplicação de cargos

O projeto de reforma administrativa do Senado, com votação prevista para esta quarta-feira na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), poderia estancar o descontrole de cargos comissionados nos gabinetes parlamentares, especialmente nos estados. A proposta original, apresentada em 2009 e subsidiada por estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV), previa que nenhum senador poderia contratar mais de 25 funcionários de confiança. Porém, depois de se arrastar por mais de dois anos sem votação, a reforma já não é mais a mesma, e, agora, cada senador poderá empregar até 55 servidores - isso se a proposta realmente for aprovada.
Nesta segunda-feira, O GLOBO mostrou que o artifício da multiplicação de cargos comissionados - que não exigem concurso público - leva a casos extremos, como o de Ivo Cassol (PP-RO), que emprega 67 pessoas em Brasília e em dois escritórios regionais. “O Guia do Parlamentar” - cartilha elaborada pela diretoria do Senado e entregue a cada um dos senadores quando assume o mandato - diz que, em regra, o gabinete é composto por 12 comissionados. Mas, com o fracionamento, o limite se eleva a 76 comissionados para cada um dos 81 senadores. Cada funcionário comissionado eleva despesas, como a de auxílio-refeição, que cresceram até 157%, considerando o fracionamento dos cargos com salários mais altos em outros com vencimentos mais modestos.
Ao GLOBO, Cassol informou, por meio da assessoria, que seus 67 funcionários comparecem ao local de trabalho e atendem às reivindicações da população dos 52 municípios do estado de Rondônia. “O senador Ivo Cassol não possui uma cidade ou uma região como base eleitoral. Por ter sido governador de Rondônia por dois mandatos, o senador Ivo Cassol é constantemente procurado pela população de todos os municípios e distritos, alguns distantes mais de 1.000 quilômetros um do outro, o que praticamente inviabiliza estar em todos, toda semana”, afirma a assessoria. Cassol mandou demitir, no entanto, o funcionário do gabinete que, ao mesmo tempo, recebia pela Assembleia Legislativa de Rondônia e pelo Senado. O nome do servidor constava no Quadro de Servidores Comissionados até a última sexta-feira. Nesta segunda-feira, já não aparecia mais.
O senador Fernando Collor (PTB-AL) emprega 54 comissionados e, de acordo com a assessoria, está dentro dos limites da proposta de reforma administrativa, ainda não votada. Em 2009, o artigo 393 da Reforma Administrativa afirmava que, a partir de fevereiro de 2011, o número total de comissionados em cada gabinete “não poderia exceder a 25”, observados os possíveis desdobramentos. Na atual proposta, o assunto foi remetido para o artigo 205, que manteve texto idêntico, mas com o limite de 55 comissionados.

Menos cargos, menos favores

Já o senador Waldemir Moka (PMDB-MS) reagiu nesta segunda-feira à revelação de que boa parte dos senadores dispensa os servidores de bater ponto. Segundo vice-presidente do Senado, ele disse ter determinado à chefe de gabinete de seu setor que cancele a regalia e exija que todos passem a registrar o horário de entrada e de saída. Moka afirmou que a dispensa da obrigação do ponto na Segunda Vice-Presidência foi permitida por seu antecessor, o então senador Wilson Santiago (PMDB-PB), que perdeu o mandato depois que Cassio Cunha Lima (PSDB-PB) pôde assumir a cadeira, em novembro do ano passado, depois de ter sido barrado pela Lei da Ficha Limpa. O descontrole dos servidores que não precisam bater ponto foi evidenciado por contratações de pessoas que atuam na iniciativa privada em tempo integral e que até passaram temporada fora do Brasil, como O GLOBO revelou no domingo.
Procurada para falar a respeito das suspeitas de pagamento para servidores que não cumprem sua carga horária nos gabinetes, a assessoria de imprensa do Senado Federal não se pronunciou até o fechamento desta edição.
Para a diretora do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Jovita Rosa, a redução do número de comissionados por gabinete é a única forma de evitar os casos suspeitos de não cumprimento da carga horária ou mesmo da nomeação de políticos condenados por má gestão de dinheiro público em prefeituras e câmaras municipais.
- É a hora de repensar o quantitativo de servidores por gabinete. Principalmente para tirar dos cargos, usados para retribuir favores, políticos que já demonstraram que não têm compromisso com a coisa pública - afirmou Jovita.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) defendeu a adoção da Ficha Limpa para a nomeação de servidores no Senado. Ele acredita que o Senado aprovará um projeto nesse sentido. Simon, que tem 12 servidores comissionados em seu gabinete e escritório político, acha exagerado o número de auxiliares que alguns colegas mantêm.
- Deveria existir um limite. Não só na questão da verba, mas também um número máximo de funcionários.

Por O Globo