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Delta e Cachoeira usaram laranjas também no Rio

A rede de laranjas que alimentava, com o dinheiro da Delta Construções, o esquema do bicheiro Carlinhos Cachoeira não é exclusiva de Goiás e se estendeu ao Rio, sede da empreiteira. Os sócios de duas empresas que sacaram dinheiro da Brava Construções — apontada como fantasma pela investigação da operação Monte Carlo, da Polícia Federal —, são moradores de áreas pobres da cidade e dizem desconhecer por que aparecem como donos das firmas. A Zuk Assessoria Empresarial e a Flexa Factoring Fomento Mercantil, de acordo com a Federal, têm o mesmo endereço, no Centro do Rio, onde há apenas um escritório. As duas empresas eram sediadas lá entre 2008 e 2011, mas nunca funcionaram de fato. Sacaram, juntas, R$ 521 mil.
A auxiliar de serviço gerais Cristina Lacerda de Almeida, de 41 anos, aparece como sócia da Flexa Factoring, que recebeu da Brava Construções R$ 119.442,27. Moradora do Encantado, Zona Norte, Cristina disse ao GLOBO nunca ter ouvido falar da Flexa nem dos recursos. Desempregada há um ano, mora com a mãe e os quatro filhos num casebre alugado por R$ 150 por mês. Ela conta que perdeu identidade e CPF há cinco anos, mas não registrou o fato na delegacia.
— Fiquei surpresa. Nem sei o que falar. Minha ficha não caiu. Acompanho pouco o caso (Cachoeira). Para ser sincera, nem quero ver mais isto na televisão. Sei que tudo vai acabar em pizza — disse Cristina.

Sócios tiveram sigilo bancário quebrado

Outra que figura como sócia da Flexa Factoring é Tatiana Correia Rodrigues, de 26 anos. Moradora do Encantado, ela vive numa vila. O aluguel, segundo o pai dela, que não se identificou, está atrasado há cinco meses. Tatiana está desempregada há três. Com medo, não deu entrevista.
— Ela está abalada. Estamos desorientados. Minha filha perdeu os documentos há quatro anos e assinou documentos que não lembra o que eram. Tenho certeza que não tem nada a ver com isso — afirmou o pai de Tatiana.
Já Maria Aparecida Corrêa, de 40 anos, moradora de um conjunto habitacional na Piedade, Zona Norte, é sócia da Zuk Assessoria Empresarial, que recebeu da Brava Construções R$ 401.887,04. Ela disse ter assinado procuração e reconhecido firma há quatro anos, quando trabalhava em uma padaria. O documento foi dado a uma pessoa que prometeu conseguir um financiamento — e que nunca mais viu.
— Fui burra e idiota. Eu queria sair do aluguel e dar uma vida melhor para a minha filha. Fui na confiança porque ele era cliente da padaria e, depois disso, ele desapareceu.
Aparecida é auxiliar de serviços gerais e recebe R$ 640. O marido, autônomo, não tem salário fixo.
— Nem sei quem é Cachoeira. Nunca ouvi falar de empresa. É horrível. Minha conta está no vermelho.
O outro sócio da Zuk é Edivaldo Ferreira Lopes, que mora em Leopoldina (MG). Parentes dele, que vivem no Rio, negam participação.
— Ele é ajudante de caminhão e pobre. Devem ter usado os documentos para ele ser laranja — afirmou a cunhada Germana Ramos.
Os sigilos bancário e fiscal da Zuk e da Flexa Factoring e de seus sócios Cristina Lacerda de Almeida, Tatiana Correia Rodrigues, Edivaldo Ferreira Lopes e Maria Aparecida Corrêa foram quebrados em 2011, na Operação Monte Carlo. E vai de 1º de janeiro de 2010 a 1º de agosto de 2011. De acordo com os autos da operação Montecarlo, “diligências financeiras e fiscais” serão feitas em torno dos “responsáveis pela manutenção financeira da suposta organização criminosa”.
A Brava Construções e a Alberto Pantoja foram abastecidas exclusivamente com recursos da Delta. Ao todo, movimentaram R$ 39 milhões.

Por O Globo