Rio nos deve R$ 300 milhões, diz novo presidente da Delta
A Delta não está falida. Tem R$ 4,7 bilhões em contratos em execução e
R$ 450 milhões para receber de obras já concluídas, dos quais cerca de
R$ 300 milhões deveriam ter sido pagos no mês passado pelo governo do
Estado do Rio.
É o que afirma Carlos Alberto Verdini, que substituiu Fernando Cavendish na presidência do Conselho de Administração da construtora, investigada pela Polícia Federal por suposta relação ilícita com o empresário goiano Carlos Cachoeira.
"Não é questão de atraso [do Rio]. Acho que é problema de caixa do governo", disse Verdini, 65, à Folha. A assessoria do governo estadual disse que precisa de mais tempo para levantar valores devidos à Delta.
No Rio, a Delta deixará as obras do Maracanã e da via expressa Transcarioca, mas Verdini afirmou que continua executando todos os demais 200 contratos, 130 deles para o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes).
A empresa não seria facilmente substituída, disse: "Em muitas obras teria que ser feita nova licitação, com preços mais caros. O processo é demorado, o prejuízo seria grande. E quero saber como fica a responsabilidade social. Quem vai assumir o ônus de pôr 30 mil funcionários na rua?".
Verdini está na Delta há nove anos e era diretor comercial. Antes, trabalhou 13 anos para a Queiroz Galvão e 14 para a Camargo Corrêa. Não quis comentar a possibilidade de venda da empresa, negociada por Cavendish: "Não é decisão minha".
Abaixo, a íntegra da entrevista.
Folha - O sr. é sócio da Delta?
Carlos Verdini - Não, os diretores são estatutários, não fazem parte da sociedade.
Folha - O sr. nunca esteve tanto tempo sob os holofotes.
Verdini - Não, nunca saí na mídia.
Folha - Há informações de que a venda da Delta está sendo negociada, e que o grupo JBS está interessado. O sr. confirma?
Verdini - Não falo sobre esse assunto.
Folha - Seria melhor que a Delta fosse vendida e pudesse descolar da figura do Cavendish?
Verdini - Não falo sobre esse assunto porque não é uma decisão minha. A minha função é continuar tocando a empresa e fazer com que ela continue executando seus contratos, cumprindo seus compromissos e preservando os empregos.
Folha - Quanto a Delta vale hoje?
Verdini - Não sei dizer.
Folha - E quanto tem em contratos?
Verdini - O saldo contratual a executar é R$ 4,7 bilhões. Só no Dnit são em torno de 130 contratos. No total, temos 200, todos em execução. Temos já medidos e executados, na boca do caixa para receber em torno de R$ 450 milhões.
Folha - Desde que apareceu o envolvimento da Delta com Cachoeira, o governo federal e o governo do Rio anunciaram revisão de todos os contratos com a empresa. Isso já provocou atraso em pagamentos devidos à Delta?
Verdini - Em alguns lugares, sim, principalmente em Goiânia, onde houve o problema. O restante está normal.
Folha - O sr. sabe quanto deixou de receber no Centro-Oeste?
Verdini - Na Prefeitura de Goiânia, em torno de R$ 27 milhões. Não tenho os números do governo do Estado.
Folha - No Rio não teve atraso?
Verdini - Nós temos dinheiro a receber, mas não por questão de atraso. Acho que é problema de caixa do governo. São em torno de R$ 300 milhões. Era para ter sido pago no mês passado.
Folha - O sr. acha que não tem a ver com a auditoria?
Verdini - Não.
Folha - Esse atraso teve relação com a saída da Delta das obras do Maracanã?
Verdini - Não, esse assunto já vinha sendo tratado desde o ano passado, era uma decisão empresarial que vinha sendo discutida com os clientes e com os consorciados e está sendo formalizada.
Folha - E por que só agora a Delta deixou de aportar dinheiro para os obras? Houve problema de fluxo de caixa?
Verdini - Não, é porque os aportes devidos são de uma certa monta e, em função desse problema, temos a preocupação de manter um caixa para atender os compromissos. Nós inclusive temos dinheiro a receber do encontro de contas lá, cerca de R$ 40 milhões.
Folha - A Delta cresceu muito e está hoje entre as dez maiores construtoras do país. Só que, diferentemente das outras, manteve 90% de seus contratos no setor público. Por quê?
Verdini - O crescimento da Delta se deu porque antes as grandes empresas tinham o Dnit como seu foco. Elas derivaram, por problema estratégico delas, e tanto a Delta quanto outras empresas do mesmo porte e menores conseguiram ter oportunidades. Em função da estrutura da empresa e de ela ter um preço competitivo, ela se tornou a maior ganhadora de licitações no Dnit. Com isso, começou a se estabelecer em vários Estados da federação. Hoje está baseada em 25 Estados e cada estrutura, além de tocar aquele contrato, procurava também encontrar licitações no entorno para crescer a base local. Daí veio o crescimento dela, porque tudo foi através da Lei 8.666 [Lei de Licitações], com crivo de Tribunal de Contas, de Ministério Público.
Folha - A Delta entrou no mercado oferecendo descontos grandes nas licitações, e seus concorrentes dizem que era impossível fazer obras com esses preços.
Verdini - Para eles. Nós fazíamos a obra e ainda ganhávamos dinheiro.
Folha - Mas isso não implicava que todas as obras tinham muitos aditivos, como apontou relatório da Controladoria Geral da União?
Verdini - Na crise do Dnit anunciaram que a partir de agora o órgão só fará licitações com projetos executivos. Todos os projetos antes eram básicos, não eram definitivos. Na hora de executá-los, você se depara com serviços que não estavam previstos, tem que incluir coisas. Daí vem os aditivos, que não somos nós que impomos. Eles são discutidos com o cliente.
Folha - A proporção de aditivos nas obras da Delta é a mesma de outras obras?
Verdini - Se você for analisar outras empresas, elas também têm aditivo. Agora, como a Delta tem o maior volume de contratos [do Dnit], tem que ter o maior número de aditivos, se for necessário ter.
Folha - Por que as grandes empresas deixaram de fazer manutenção de estrada e a Delta assumiu isso?
Verdini - A Delta tem uma estrutura enxuta e preços competitivos. As grandes empresas têm uma estrutura pesada, que para esse tipo de serviço não é interessante. Elas começaram a guinar para o setor privado. A Delta tem uma estrutura que sabe trabalhar, tanto que muitas empresas admiram essa forma de a Delta trabalhar, não sabem como ela consegue ganhar dinheiro nesse tipo de trabalho.
Folha - Isso não é um campo minado? Antes, eram as outras empresas que eram alvo de denúncia de corrupção no Dnit.
Verdini - O Dnit sempre foi uma disputa política. Todo mundo quer o Dnit.
Folha - Por quê?
Verdini - Não sei. È problema deles, isso é público e notório. Agora, gera muita obra, e é preciso mesmo. Faz até menos do que deveria. Ainda há muitas estradas em situação precária justamente por esse problema, porque não tem projeto, os projetos são mal feitos, querem fazer projeto executivo agora e isso você não faz da noite para o dia. Felizmente nós descobrimos esse nicho, estamos trabalhando nele e temos tido sucesso.
Folha - Um problema recorrente com a Delta é o questionamento da documentação apresentada em licitações. Quinta-feira o Ministério Público de Tocantins fez uma denúncia nesse sentido. Teve outro caso no DER de Minas em 2005, em que um atestado foi invalidado pelo Dnit. Por que isso acontece?
Verdini - O problema de Recife [de onde veio o atestado entregue em Minas] foi esclarecido, foi um erro em uma obra antiga, dos anos 80. O atestado antigo, em vez de estar em metro cúbico como devia, porque eram placas de concreto, estava em metro quadrado. E, ao pedir a revalidação, a pessoa do Dnit, na conversão de medidas, cometeu o erro. Não foi a empresa. Teve auditoria, o ministério criou uma comissão, não teve problema nenhum. Com relação a Tocantins, está sendo apurado, julgado.
Folha - Vocês pretendem sair de outras obras?
Verdini - No momento não. Estamos preocupados em tocar os contratos em andamento, religiosamente em dia. Você há de convir que 51 anos de existência não são 51 dias. Para você chegar onde chegou, foi com competência, trabalho, e não se pode jogar isso da noite para o dia na vala comum. A empresa não é de fundo de quintal. O maior patrimônio dela são seus colaboradores, que fizeram com que ela chegasse onde chegou. A minha função é manter isso e, se possível, crescer mais ainda.
Folha - Em entrevista à Folha, Cavendish disse que a empresa ia quebrar. Vai?
Verdini - Quando ele falou isso, quis dizer o seguinte: se ninguém pagar mais à Delta, se os bancos se fecharem e tudo mais, vai chegar um dia em que os recursos que ela têm vão terminar. Aí você teria um problema sério. Mas não é essa a situação. Ela está com a situação financeira tranquila, tem dinheiro a receber, e vai continuar tocando sua vida.
Folha - A Delta tem quanto em caixa?
Verdini - Posso garantir que tem. E pagamos todos os salários em dia. Temos 30 mil funcionários, diretos e indiretos. O que nós queremos e esperamos é o seguinte: toda e qualquer licitação e contrato é uma via de duas mãos. Nós estamos cumprindo nossas obrigações, e esperamos que cada cliente cumpra com a sua quando a fatura chegar no caixa e nos pague.
Folha - Como era a relação da Delta com o senador Demóstenes? As gravações da PF mostram intervenções dele em favor da empresa. Quem era o interlocutor do Demóstenes?
Verdini - Eu desconheço. A única pessoa que eu sei que tinha esse relacionamento era o nosso ex-diretor de lá, o Cláudio Abreu. Em todas as fitas você vê que é ele que fala em nome dele, não vê nenhum momento o nome do Fernando. O nome do [Carlos] Pacheco [diretor executivo da empresa, afastado] é falado, mas ninguém vê gravação do Pacheco, ele é citado pelo Cláudio. Não tem fita nenhuma dele.
Folha - O sr. conhecia o Cláudio Abreu?
Verdini - Claro.
Folha - O sr. sabia da relação dele com Cachoeira?
Verdini - Foi uma surpresa total.
Folha - De quanto em quanto tempo a diretoria se reunia?
Verdini - Mais ou menos de dois em dois meses, mas os diretores regionais tem autonomia, pelo estatuto da empresa.
Folha - O sr. conhecia Cachoeira e Demóstenes?
Verdini - Não.
Folha - Nunca falou com eles?
Verdini - Nunca.
Folha - A ministra Miriam Belchior (Planejamento) indicou que não haveria problema em substituir a Delta nas obras federais, se for o caso. O sr. acha que é fácil substituir a Delta?
Verdini - Não trabalho com essa hipótese. Acho que isso não vai ocorrer. E claro que não é tão fácil assim não. Em muitas obras teria que ser feita nova licitação, com preços mais caros. O processo é demorado. O prejuízo vai ser grande. E quero saber como fica a responsabilidade social, 30 mil funcionários no olho da rua. Quem vai assumir esse ônus?
Folha - O sr. já foi conversar com pessoas do governo federal?
Verdini - Estou para agendar conversa com ela [Belchior] e com a CGU. Vou mostrar o que é a empresa e dar uma segurança de que os contratos vão ser tocados. Nós temos que deixar que os fatos sejam apurados. Tem que deixar concluir as apurações para saber quem é de fato culpado.
Folha - O sr. anunciou que seria feita uma auditoria interna e externa na Delta. Já há resultados?
Verdini - Não ainda. A auditoria está sendo feita com total isenção. Queremos que seja feita a fundo, até para dar subsídios à CPI. se ela precisar. Também está sendo auditada toda a movimentação financeira da empresa, principalmente no Centro-Oeste. A empresa externa contratada é a GMW Auditores e Consultores, que é registrada na CVM.
Folha - Aqui no Rio há um problema grave, ao menos de imagem, em função da intimidade do dono da Delta com o governador. Antes disso, a Delta já financiava campanhas no Estado, como a do deputado Eduardo Cunha, presidente da Cedae no governo Garotinho, e a Delta tem contrato com a Cedae. Essa prática tem que ser revista?
Verdini - Doação de campanha é uma coisa corriqueira dentro da legalidade. Não vejo correlação com contratos. O relacionamento dele [Cavendish] com o governador é público e notório, eles se conhecem desde a infância. Mas tudo que se ganhoi aqui foi através de concorrência. Além do mais, todos os contratos são fiscalizados. Não temos medo nenhum de nenhuma auditoria.
Folha - A relação entre empresários e autoridades não deveria ser mais sóbria do que Cavendish e Cabral demonstraram?
Verdini - Se eles omitissem que tinham uma amizade, não seria pior? É questão de saber separar o que é social e o que é comercial. Se o comercial está dentro da legislação em vigor, foi com concorrência, se não se ganhou nada de mão beijada. E vou dizer mais: se vocês fizerem uma pesquisa de todas as empresas trabalhando no Estado, vão ver que não é a Delta que tem mais contrato. Ela está em terceiro ou no quarto lugar. Isso talvez até seja motivo de alguém na CPI levantar essa informação, porque está sendo muito discutido.
Folha - E quem tem mais contrato no Estado?
Verdini - Não sei. Só lhe garanto que não é a Delta. No Dnit eu lhe digo que a Delta é que mais recebe.
Folha - A reputação da empresa não está manchada para sempre?
Verdini - Como falei, não tenho receio nenhum de auditoria dos contratos. É lógico que o nome da empresa está sendo estampado de uma forma negativa. Ao final disso tudo, vamos ter que fazer um trabalho para melhorar a imagem da empresa, mas os resultados em si da apuração já vão ser um passo para isso.
Folha - O sr. tem dormido bem?
Verdini - Tranquilamente. Não devo nada, não temo nada, tenho a saúde perfeita.
Folha - Se o sr. for convocado para depor na CPI?
Verdini - Vou tranquilamente, não tenho nada a temer.
Folha - O afastamento do Cavendish da direção significa o que na prática? Ele não deixa de receber como dono da empresa, não é?
Verdini - Claro que não. Esse afastamento foi para permitir que a auditoria fizesse um trabalho isento, sem nenhuma influência.
É o que afirma Carlos Alberto Verdini, que substituiu Fernando Cavendish na presidência do Conselho de Administração da construtora, investigada pela Polícia Federal por suposta relação ilícita com o empresário goiano Carlos Cachoeira.
"Não é questão de atraso [do Rio]. Acho que é problema de caixa do governo", disse Verdini, 65, à Folha. A assessoria do governo estadual disse que precisa de mais tempo para levantar valores devidos à Delta.
No Rio, a Delta deixará as obras do Maracanã e da via expressa Transcarioca, mas Verdini afirmou que continua executando todos os demais 200 contratos, 130 deles para o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes).
A empresa não seria facilmente substituída, disse: "Em muitas obras teria que ser feita nova licitação, com preços mais caros. O processo é demorado, o prejuízo seria grande. E quero saber como fica a responsabilidade social. Quem vai assumir o ônus de pôr 30 mil funcionários na rua?".
Verdini está na Delta há nove anos e era diretor comercial. Antes, trabalhou 13 anos para a Queiroz Galvão e 14 para a Camargo Corrêa. Não quis comentar a possibilidade de venda da empresa, negociada por Cavendish: "Não é decisão minha".
Abaixo, a íntegra da entrevista.
Folha - O sr. é sócio da Delta?
Carlos Verdini - Não, os diretores são estatutários, não fazem parte da sociedade.
Folha - O sr. nunca esteve tanto tempo sob os holofotes.
Verdini - Não, nunca saí na mídia.
Folha - Há informações de que a venda da Delta está sendo negociada, e que o grupo JBS está interessado. O sr. confirma?
Verdini - Não falo sobre esse assunto.
Folha - Seria melhor que a Delta fosse vendida e pudesse descolar da figura do Cavendish?
Verdini - Não falo sobre esse assunto porque não é uma decisão minha. A minha função é continuar tocando a empresa e fazer com que ela continue executando seus contratos, cumprindo seus compromissos e preservando os empregos.
Folha - Quanto a Delta vale hoje?
Verdini - Não sei dizer.
Folha - E quanto tem em contratos?
Verdini - O saldo contratual a executar é R$ 4,7 bilhões. Só no Dnit são em torno de 130 contratos. No total, temos 200, todos em execução. Temos já medidos e executados, na boca do caixa para receber em torno de R$ 450 milhões.
Folha - Desde que apareceu o envolvimento da Delta com Cachoeira, o governo federal e o governo do Rio anunciaram revisão de todos os contratos com a empresa. Isso já provocou atraso em pagamentos devidos à Delta?
Verdini - Em alguns lugares, sim, principalmente em Goiânia, onde houve o problema. O restante está normal.
Folha - O sr. sabe quanto deixou de receber no Centro-Oeste?
Verdini - Na Prefeitura de Goiânia, em torno de R$ 27 milhões. Não tenho os números do governo do Estado.
Folha - No Rio não teve atraso?
Verdini - Nós temos dinheiro a receber, mas não por questão de atraso. Acho que é problema de caixa do governo. São em torno de R$ 300 milhões. Era para ter sido pago no mês passado.
Folha - O sr. acha que não tem a ver com a auditoria?
Verdini - Não.
Folha - Esse atraso teve relação com a saída da Delta das obras do Maracanã?
Verdini - Não, esse assunto já vinha sendo tratado desde o ano passado, era uma decisão empresarial que vinha sendo discutida com os clientes e com os consorciados e está sendo formalizada.
Folha - E por que só agora a Delta deixou de aportar dinheiro para os obras? Houve problema de fluxo de caixa?
Verdini - Não, é porque os aportes devidos são de uma certa monta e, em função desse problema, temos a preocupação de manter um caixa para atender os compromissos. Nós inclusive temos dinheiro a receber do encontro de contas lá, cerca de R$ 40 milhões.
Folha - A Delta cresceu muito e está hoje entre as dez maiores construtoras do país. Só que, diferentemente das outras, manteve 90% de seus contratos no setor público. Por quê?
Verdini - O crescimento da Delta se deu porque antes as grandes empresas tinham o Dnit como seu foco. Elas derivaram, por problema estratégico delas, e tanto a Delta quanto outras empresas do mesmo porte e menores conseguiram ter oportunidades. Em função da estrutura da empresa e de ela ter um preço competitivo, ela se tornou a maior ganhadora de licitações no Dnit. Com isso, começou a se estabelecer em vários Estados da federação. Hoje está baseada em 25 Estados e cada estrutura, além de tocar aquele contrato, procurava também encontrar licitações no entorno para crescer a base local. Daí veio o crescimento dela, porque tudo foi através da Lei 8.666 [Lei de Licitações], com crivo de Tribunal de Contas, de Ministério Público.
Folha - A Delta entrou no mercado oferecendo descontos grandes nas licitações, e seus concorrentes dizem que era impossível fazer obras com esses preços.
Verdini - Para eles. Nós fazíamos a obra e ainda ganhávamos dinheiro.
Folha - Mas isso não implicava que todas as obras tinham muitos aditivos, como apontou relatório da Controladoria Geral da União?
Verdini - Na crise do Dnit anunciaram que a partir de agora o órgão só fará licitações com projetos executivos. Todos os projetos antes eram básicos, não eram definitivos. Na hora de executá-los, você se depara com serviços que não estavam previstos, tem que incluir coisas. Daí vem os aditivos, que não somos nós que impomos. Eles são discutidos com o cliente.
Folha - A proporção de aditivos nas obras da Delta é a mesma de outras obras?
Verdini - Se você for analisar outras empresas, elas também têm aditivo. Agora, como a Delta tem o maior volume de contratos [do Dnit], tem que ter o maior número de aditivos, se for necessário ter.
Folha - Por que as grandes empresas deixaram de fazer manutenção de estrada e a Delta assumiu isso?
Verdini - A Delta tem uma estrutura enxuta e preços competitivos. As grandes empresas têm uma estrutura pesada, que para esse tipo de serviço não é interessante. Elas começaram a guinar para o setor privado. A Delta tem uma estrutura que sabe trabalhar, tanto que muitas empresas admiram essa forma de a Delta trabalhar, não sabem como ela consegue ganhar dinheiro nesse tipo de trabalho.
Folha - Isso não é um campo minado? Antes, eram as outras empresas que eram alvo de denúncia de corrupção no Dnit.
Verdini - O Dnit sempre foi uma disputa política. Todo mundo quer o Dnit.
Folha - Por quê?
Verdini - Não sei. È problema deles, isso é público e notório. Agora, gera muita obra, e é preciso mesmo. Faz até menos do que deveria. Ainda há muitas estradas em situação precária justamente por esse problema, porque não tem projeto, os projetos são mal feitos, querem fazer projeto executivo agora e isso você não faz da noite para o dia. Felizmente nós descobrimos esse nicho, estamos trabalhando nele e temos tido sucesso.
Folha - Um problema recorrente com a Delta é o questionamento da documentação apresentada em licitações. Quinta-feira o Ministério Público de Tocantins fez uma denúncia nesse sentido. Teve outro caso no DER de Minas em 2005, em que um atestado foi invalidado pelo Dnit. Por que isso acontece?
Verdini - O problema de Recife [de onde veio o atestado entregue em Minas] foi esclarecido, foi um erro em uma obra antiga, dos anos 80. O atestado antigo, em vez de estar em metro cúbico como devia, porque eram placas de concreto, estava em metro quadrado. E, ao pedir a revalidação, a pessoa do Dnit, na conversão de medidas, cometeu o erro. Não foi a empresa. Teve auditoria, o ministério criou uma comissão, não teve problema nenhum. Com relação a Tocantins, está sendo apurado, julgado.
Folha - Vocês pretendem sair de outras obras?
Verdini - No momento não. Estamos preocupados em tocar os contratos em andamento, religiosamente em dia. Você há de convir que 51 anos de existência não são 51 dias. Para você chegar onde chegou, foi com competência, trabalho, e não se pode jogar isso da noite para o dia na vala comum. A empresa não é de fundo de quintal. O maior patrimônio dela são seus colaboradores, que fizeram com que ela chegasse onde chegou. A minha função é manter isso e, se possível, crescer mais ainda.
Folha - Em entrevista à Folha, Cavendish disse que a empresa ia quebrar. Vai?
Verdini - Quando ele falou isso, quis dizer o seguinte: se ninguém pagar mais à Delta, se os bancos se fecharem e tudo mais, vai chegar um dia em que os recursos que ela têm vão terminar. Aí você teria um problema sério. Mas não é essa a situação. Ela está com a situação financeira tranquila, tem dinheiro a receber, e vai continuar tocando sua vida.
Folha - A Delta tem quanto em caixa?
Verdini - Posso garantir que tem. E pagamos todos os salários em dia. Temos 30 mil funcionários, diretos e indiretos. O que nós queremos e esperamos é o seguinte: toda e qualquer licitação e contrato é uma via de duas mãos. Nós estamos cumprindo nossas obrigações, e esperamos que cada cliente cumpra com a sua quando a fatura chegar no caixa e nos pague.
Folha - Como era a relação da Delta com o senador Demóstenes? As gravações da PF mostram intervenções dele em favor da empresa. Quem era o interlocutor do Demóstenes?
Verdini - Eu desconheço. A única pessoa que eu sei que tinha esse relacionamento era o nosso ex-diretor de lá, o Cláudio Abreu. Em todas as fitas você vê que é ele que fala em nome dele, não vê nenhum momento o nome do Fernando. O nome do [Carlos] Pacheco [diretor executivo da empresa, afastado] é falado, mas ninguém vê gravação do Pacheco, ele é citado pelo Cláudio. Não tem fita nenhuma dele.
Folha - O sr. conhecia o Cláudio Abreu?
Verdini - Claro.
Folha - O sr. sabia da relação dele com Cachoeira?
Verdini - Foi uma surpresa total.
Folha - De quanto em quanto tempo a diretoria se reunia?
Verdini - Mais ou menos de dois em dois meses, mas os diretores regionais tem autonomia, pelo estatuto da empresa.
Folha - O sr. conhecia Cachoeira e Demóstenes?
Verdini - Não.
Folha - Nunca falou com eles?
Verdini - Nunca.
Folha - A ministra Miriam Belchior (Planejamento) indicou que não haveria problema em substituir a Delta nas obras federais, se for o caso. O sr. acha que é fácil substituir a Delta?
Verdini - Não trabalho com essa hipótese. Acho que isso não vai ocorrer. E claro que não é tão fácil assim não. Em muitas obras teria que ser feita nova licitação, com preços mais caros. O processo é demorado. O prejuízo vai ser grande. E quero saber como fica a responsabilidade social, 30 mil funcionários no olho da rua. Quem vai assumir esse ônus?
Folha - O sr. já foi conversar com pessoas do governo federal?
Verdini - Estou para agendar conversa com ela [Belchior] e com a CGU. Vou mostrar o que é a empresa e dar uma segurança de que os contratos vão ser tocados. Nós temos que deixar que os fatos sejam apurados. Tem que deixar concluir as apurações para saber quem é de fato culpado.
Folha - O sr. anunciou que seria feita uma auditoria interna e externa na Delta. Já há resultados?
Verdini - Não ainda. A auditoria está sendo feita com total isenção. Queremos que seja feita a fundo, até para dar subsídios à CPI. se ela precisar. Também está sendo auditada toda a movimentação financeira da empresa, principalmente no Centro-Oeste. A empresa externa contratada é a GMW Auditores e Consultores, que é registrada na CVM.
Folha - Aqui no Rio há um problema grave, ao menos de imagem, em função da intimidade do dono da Delta com o governador. Antes disso, a Delta já financiava campanhas no Estado, como a do deputado Eduardo Cunha, presidente da Cedae no governo Garotinho, e a Delta tem contrato com a Cedae. Essa prática tem que ser revista?
Verdini - Doação de campanha é uma coisa corriqueira dentro da legalidade. Não vejo correlação com contratos. O relacionamento dele [Cavendish] com o governador é público e notório, eles se conhecem desde a infância. Mas tudo que se ganhoi aqui foi através de concorrência. Além do mais, todos os contratos são fiscalizados. Não temos medo nenhum de nenhuma auditoria.
Folha - A relação entre empresários e autoridades não deveria ser mais sóbria do que Cavendish e Cabral demonstraram?
Verdini - Se eles omitissem que tinham uma amizade, não seria pior? É questão de saber separar o que é social e o que é comercial. Se o comercial está dentro da legislação em vigor, foi com concorrência, se não se ganhou nada de mão beijada. E vou dizer mais: se vocês fizerem uma pesquisa de todas as empresas trabalhando no Estado, vão ver que não é a Delta que tem mais contrato. Ela está em terceiro ou no quarto lugar. Isso talvez até seja motivo de alguém na CPI levantar essa informação, porque está sendo muito discutido.
Folha - E quem tem mais contrato no Estado?
Verdini - Não sei. Só lhe garanto que não é a Delta. No Dnit eu lhe digo que a Delta é que mais recebe.
Folha - A reputação da empresa não está manchada para sempre?
Verdini - Como falei, não tenho receio nenhum de auditoria dos contratos. É lógico que o nome da empresa está sendo estampado de uma forma negativa. Ao final disso tudo, vamos ter que fazer um trabalho para melhorar a imagem da empresa, mas os resultados em si da apuração já vão ser um passo para isso.
Folha - O sr. tem dormido bem?
Verdini - Tranquilamente. Não devo nada, não temo nada, tenho a saúde perfeita.
Folha - Se o sr. for convocado para depor na CPI?
Verdini - Vou tranquilamente, não tenho nada a temer.
Folha - O afastamento do Cavendish da direção significa o que na prática? Ele não deixa de receber como dono da empresa, não é?
Verdini - Claro que não. Esse afastamento foi para permitir que a auditoria fizesse um trabalho isento, sem nenhuma influência.
Por Folha