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FMI recomenda taxação para empresas poluidoras

O Fundo Monetário Internacional (FMI) recomenda que os países usem a tributação e a redução de subsídios como armas para tornar transparentes os custos socioambientais do padrão atual de crescimento global e levantar recursos que financiem o desenvolvimento sustentável. A receita, inovadora para um organismo multilateral que tem a estabilidade financeira como missão e o chamado neoliberalismo em seu DNA, foi apresentada, nesta terça-feira, pela diretora-gerente do Fundo, Christine Lagarde, em evento sobre a Rio+20 do think tank Centro para o Desenvolvimento Global.
Para o FMI, os governos deveriam criar taxas ambientais, adequar tarifas de licenciamento (por exemplo para exploração de recursos naturais) e estabelecer sistemas de emissão de “direitos de poluir”. O organismo multilateral lançou nesta terça-feira um e-book para servir de guia de implementação de políticas de negociação de carbono (www.imf.org).
Lagarde salientou ainda a importância de os países reduzirem subsídios a fontes de energia poluentes, como o carvão — que só na Índia causa 77 mil mortes prematuras anualmente. Mas chamou a atenção para que a retirada não afete os mais pobres e que sejam pensados mecanismos de subvenção direta a quem precisa da ajuda governamental, citando como exemplos experiências no Irã e na Nigéria.
— Eu tive a sorte de ter uma babá 25 anos atrás. Ela era polonesa. Uma vez cheguei em casa e as torneiras estavam abertas. Eu disse a ela: você tem que fechá-las, é muito caro. Ela respondeu: ‘Na Polônia (comunista) a gente não paga nada’. Isso é para pontuar que se não há preço (para o uso de recursos), não há custo, pode-se desperdiçar. Então, atribuir o preço correto é algo crítico e no que o FMI pode ajudar — afirmou Lagarde, que participará da Rio+20.
A diretora-gerente destacou duas vantagens da estratégia de usar o peso no bolso como mecanismo de conscientização e financiamento de iniciativas verdes. Por um lado, ao estabelecer um novo preço para o uso dos recursos, há o incentivo à mudança, com o desenvolvimento de novas tecnologias limpas e investimentos em eficiência energética e fontes renováveis. Isso terá impacto positivo sobre o crescimento e a criação de empregos.
Por outro, disse Lagarde, ex-ministra das Finanças da França, tributação, em tempos de restrição orçamentária ao redor do mundo, “ressoa bem com ministros de Economia”. Os técnicos do Fundo calculam que, nos Estados Unidos, uma taxação de US$ 25 por tonelada de carbono emitida resultaria em apenas 22 centavos de dólar a mais no preço do galão da gasolina, mas levantaria US$ 1 trilhão em receitas em dez anos (1% do Produto Interno Bruto americano).
Em outra estimativa, a taxação de emissões da aviação e da navegação internacionais teria o potencial de levantar US$ 25 bilhões — um quarto do que, segundo o FMI, os países ricos se comprometeram a levantar até 2020 para atenuar os efeitos das mudanças climáticas nas nações em desenvolvimento.
— O FMI não é uma organização ambiental, é uma instituição financeira internacional cujo objetivo é ajudar na estabilidade financeira do mundo. Mas não podemos ignorar o extenso sofrimento humano e a alocação deficiente de recursos que nos conduz ao caminho errado — disse Lagarde, que fez sua estreia no primeiro escalão do governo francês como ministra da Agricultura e da Pesca, período no qual o mercado de carbono da França foi iniciado.
O Fundo, segundo a diretora-gerente, está trabalhando para desenvolver ferramentas melhores para o uso da tributação e de sistemas de negociação de carbono e ajudar os países-membros na implementação dessas políticas. Um dos eventos dos quais a instituição participará na Rio+20 será sobre este tema. Estudos estão sendo feitos na área técnica do FMI e os primeirtos resultados deverão ser conhecidos no fim de 2012.

Caminho de desenvolvimento verde começa com retomada da estabilidade financeira

Lagarde afirmou ainda que o organismo está trabalhando junto com as Nações Unidas e o Banco Mundial para mensurar as reservas, os usos e os custos potenciais dos recursos naturais, uma espécie de PIB verde. A diretora-gerente não acredita que esta medida suplantará os indicadores tradicionais como referência, mas defendeu a iniciativa para aumentar a transparência da situação ambiental global e ajudar a formulação de políticas sustentáveis.
Para Lagarde, o caminho do desenvolvimento verde, porém, começa com o resgate da estabilidade financeira e do crescimento internacionais, ou seja, com a resolução da crise atualmente em curso. Isso porque se abrem oportunidades para políticas de médio e longo prazos que promovam reformas estruturais, especialmente nos países ricos, que reduzam o desemprego — há 200 milhões de desempregados hoje no mundo, 75 milhões dos quais são jovens — e preparem terreno para um novo ciclo de expansão sustentada e sustentável.
— A crise está hoje no topo das prioridades simplesmente porque é urgente. Mas mesmo difícil, longa, onerosa, a crise vai caminhar para a solução. Mas os desafios de longo prazo que nós temos, não podemos relegá-los a segundo plano, porque não vão desaparecer e têm que ocupar o topo das prioridades também. Essa é certamente uma mensagem que vou levar ao Rio — afirmou a diretora-gerente do Fundo.
Política, Lagarde evitou comentar a perspectiva de que a Rio+20 produzirá resultados muito tímidos, entre outros motivos pela ausência de líderes de países-chave, como Barack Obama, presidente dos EUA. Ela preferiu apostar na importância do diálogo permanente:
— Eu não quero me focar em que tal coisa pode ser um sucesso e tal coisa um fracasso. Da minha perspectiva, a meta é ser (um processo) continuado, avançar em direção a objetivos gerais da Rio+20. Não na quantia, na estrutura, alguma coisa que daria manchetes. Eu quero dizer apenas: estou aqui como diretora-gerente do FMI, temos expertise, no campo do preço, dos subsídios, de incorporar crescimento inclusivo. E queremos ajudar.

Por O Globo