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Após 33 mortos, protestos derrubam governo de transição no Egito, diz TV

As intensas manifestações que voltaram a tomar o centro da capital do Egito nos últimos três dias, com 33 mortos e mais de 1.700 feridos, derrubaram o governo de transição apontado pela junta militar que ainda se mantinha no poder meses após a queda do ex-ditador Hosni Mubarak, informa a emissora de TV Al Jazeera, com sede no Qatar. A renúncia já havia sido apresentada ao Conselho Supremo das Forças Armadas ontem (20), quando as manifestações da população que pede o fim imediato do governo de transição e ficaram ainda mais violentos, mas só foi tornada pública agora.
As informações sobre a posição oficial da cúpula militar do país quanto à renúncia do gabinete ainda é incerta.
Segundo a Al Jazeera, o Conselho já teria aceitado a renúncia, o que de fato já encerraria o governo. A agência de notícias Reuters, no entanto, diz que a cúpula militar estaria ainda em busca da definição de um nome para ocupar o cargo de primeiro-ministro interino antes de oficializar o aceite.
Mohamed Hegazy, porta-voz do gabinete, disse que "considerando as circunstâncias difíceis que o país atravessa no período atual, o governo continuará a desenvolver totalmente suas obrigações até que uma decisão sobre a renúncia seja feita", segundo a agência estatal de notícias Mena.
 
EUA
 
Pouco antes, os Estados Unidos exortaram o governo militar egípcio a manter as eleições parlamentares marcadas para a próxima segunda-feira (28) apesar dos confrontos que se instalaram no centro da capital, Cairo, quando manifestantes voltaram à praça Tahrir em protestos pelo fim imediato da junta militar de transição que ainda está no poder, meses após a queda do ex-ditador Hosni Mubarak.
A onda de violência, que já entra no terceiro dia nesta segunda-feira, é a pior desde os protestos que lograram o fim do regime ditatorial de Mubarak no início do ano. Policiais têm reprimido de forma violenta as intensas manifestações no centro da capital egípcia, Cairo.
"Os Estados Unidos continuam a acreditar que estes eventos trágicos não colocam um obstáculo às eleições", disse Jay Carney, porta-voz da Casa Branca, acrescentando ainda um apelo para que haja contenção dos dois lados dos conflitos.
O conflito se concentra na praça Tahrir, que em fevereiro deste ano foi palco de uma manifestação de 18 dias que derrubou Mubarak de suas três décadas no poder.
Os atos de violência foram registrados quando a polícia egípcia tentou desalojar manifestantes do local, durante um protesto iniciado na semana passada pela transferência imediata do poder dos militares para os civis.
Os manifestantes pedem o fim do governo militar que se instalou desde a queda de Mubarak, principalmente a saída de Hussein Tantauí, ligado ao antigo regime e hoje chefe do Conselho Supremo das Forças Armadas do país.
A polícia usou gás lacrimogêneo e atacou um hospital de campanha enquanto manifestantes arrancavam blocos das vias públicas para lançá-los contra os policiais.
 
CONFRONTOS SE ESPALHAM
 
Os enfrentamentos mais violentos ocorrem perto do ministério do Interior, próximo à praça Tahrir. Também foram registrados confrontos em outras grandes cidades do Egito, incluindo Alexandria e Suez.
Nesta segunda-feira, o ministro da Cultura, Emad Abu Ghazi, renunciou a seu cargo em protesto contra a violência.
Diante desse contexto de instabilidade, a bolsa do Cairo fechou nesta segunda-feira com queda de 4%.
Na noite de domingo, policiais e soldados atiraram gás lacrimogêneo e prenderam manifestantes na praça, conseguindo gerar a fuga temporária por parte dos presentes. Há relatos não confirmados de que as forças de segurança agrediram participantes dos protestos com cassetetes.
Mais tarde, os manifestantes se reagruparam e retomaram o controle da praça.
Os conflitos continuaram apesar de um acordo conquistado ontem entre o imã Mazhir Shahin, que liderou as rezas de sexta-feira antes dos protestos, e as forças de segurança, permitindo a presença dos manifestantes na praça desde que não se dirigissem a prédios do governo na região.
Um incêndio teve início num prédio nas imediações e os bombeiros tiveram dificuldades para resgatar moradores por causa da ação da polícia contra os manifestantes, o que irritou pedestres que passavam pela área. Alguns moradores do edifício tentavam escalá-lo para ajudar as pessoas que não conseguiam sair de lá.
 
INFILTRADOS
 
O responsável pelo setor de segurança do Ministério do Interior do Egito, Sami Sidhom, disse nesta segunda-feira que os distúrbios que estão ocorrendo na praça Tahrir não são organizados por ativistas, e sim por um grupo de pistoleiros, conhecido no país como "baltaguiya", o que foi negado pelos manifestantes.
O funcionário disse à televisão estatal egípcia que são os pistoleiros infiltrados que estão atacando a polícia e tentando entrar no Ministério do Interior.
Sidhom afirmou que se encontrou com representantes dos ativistas e pediu a eles que expulsem esse grupo da praça, para assim poder garantir a segurança da população.
O funcionário disse ainda que foi estabelecido um acordo com os manifestantes para que os ativistas formem comissões populares para organizar os protestos e impedir a ação dos pistoleiros. "Os manifestantes têm todo o direito de reclamar. Nós apenas reclamamos da presença dos 'baltaguiya'", disse o funcionário.
Sidhom disse ainda que os ativistas reconheceram a presença dos pistoleiros mas não cumpriram o acordo na manhã desta segunda-feira. Um representando do Movimento 6 de Abril, no entanto, negou as afirmações do governo.
"Não há infiltrados entre nós. Como o Ministério do Interior pode distinguir entre um infiltrado e um ativista? Suas balas não distinguem", disse o manifestante.
 
IMPASSE
 
Nas últimas semanas, manifestantes, em sua maioria islamitas e jovens ativistas, vêm protestando contra um projeto de Constituição que, segundo eles, permitiria que os militares mantivessem muito poder. Segundo o projeto, os militares e seu orçamento não ficariam sujeitos a uma supervisão civil.
Na sexta-feira, mais de 50 mil egípcios compareceram à praça Tahrir para pressionar a junta militar a apressar a transferência do poder para um governo civil, depois de o gabinete interino apresentar uma proposta constitucional que reafirma o poder das Forças Armadas.
Os islamitas egípcios, que convocaram a manifestação, querem protestar contra o projeto proposto pelas autoridades, estimando que a prerrogativa corresponde ao futuro Parlamento que deve ser constituído a partir de eleições que começam em 28 de novembro.
O Egito deve realizar eleições parlamentares daqui uma semana, mas o processo pode ser prejudicado se os partidos políticos e o governo não chegarem a um acordo sobre o anteprojeto constitucional, que coloca os militares a salvo de qualquer supervisão parlamentar, potencialmente permitindo que as Forças Armadas desafiem um governo eleito.
Pelo menos 39 partidos e grupos políticos disseram em nota que vão se manifestar para "proteger a democracia e a transferência de poder". Negociações entre os grupos islâmicos e o gabinete foram rompidas.

Por Folha