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CGU reprovou obra de R$ 1,2 bi que teve aval de pasta das Cidades após fraude

Operada de maneira fraudulenta no Ministério das Cidades, conforme revelou o Estado na quinta-feira, 24, a mudança do projeto de mobilidade urbana de Mato Grosso para implantar o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) foi reprovada pela Controladoria-Geral da União em relatório datado de 8 de setembro deste ano, mesmo dia em que a pasta produziu uma nota técnica forjada para respaldar a proposta. A CGU alerta que o VLT não deve ficar pronto até a Copa do Mundo de 2014 e que o governo de Mato Grosso omitiu informações sobre os gastos com a obra do VLT, orçada em pelo menos R$ 1,2 bilhão, R$ 700 milhões a mais do que a proposta original, um linha rápida de ônibus (BRT). A controladoria avalia ainda que a troca do BRT pelo VLT é "intempestiva".
A análise da CGU tem pontos coincidentes com a primeira nota técnica do ministério que era contrária ao VLT, mas que foi adulterada pela equipe do ministro, Mário Negromonte, para favorecer o projeto de interesse do governador de Mato Grosso, Sinval Barbosa (PMDB), em Cuiabá.
Um estudo incluído no relatório da CGU mostra também que o VLT de Cuiabá pode ser um dos mais caros do mundo, superando obras iguais na França e nos Estados Unidos.
A análise da CGU - relatório de número 2344 - foi feita a pedido do Ministério das Cidades e consta do processo da pasta que culminou na mudança do projeto de Cuiabá, cidade-sede da Copa, por meio de um documento forjado pelo chefe de gabinete de Negromonte, Cássio Peixoto, e pela diretora de Mobilidade Urbana da pasta, Luiza Vianna. Ou seja, o ministério deu aval a uma obra na qual o órgão de controle do governo federal apontou sérios problemas de avaliação, planejamento, preço e execução.
O parecer da CGU foi enviado ao secretário nacional de Transporte e Mobilidade Urbana, Luiz Carlos Bueno de Lima, pela diretoria de auditoria de Infraestrutura do órgão de controle.
No texto, a controladoria afirma: "Quanto ao cronograma previsto para implantação e início de operação do VLT, esta controladoria o considera por demais otimista, haja vista que algumas fases que podem ter grande impacto nos prazos de implantação não foram devidamente consideradas. Dessa forma (...), constata-se que o cronograma já se encontraria inviabilizado com vistas ao evento da Copa".
A CGU ressalta que a proposta original do BRT é mais "madura" porque já havia sido aprovada pelo governo federal, além de os contratos de financiamento com a Caixa Econômica Federal terem sido assinados.
"Quanto propriamente à decisão do Estado de Mato Grosso de alterar a opção do sistema BRT para o VLT cabe destacar sua intempestividade, tendo em vista que as propostas originais foram elaboradas pelo próprio Estado, passaram por um processo formal de seleção, com regras e critérios próprios, resultando nos contratos de financiamento já firmados", diz o relatório. A nota técnica da CGU aponta problemas na fase de desapropriação e lembra que o VLT custa mais do que o dobro do BRT.
O órgão de controle interno alerta para o fato de que o governo de Mato Grosso não detalha os custos de infraestrutura do novo projeto, já publicado na nova Matriz de Responsabilidades da Copa no dia 9 de novembro, no Diário Oficial da União.

Quilômetro caro. O relatório apresenta, por exemplo, um quadro comparativo em que coloca o VLT de Cuiabá com potencial para ser o mais caro do mundo. Pela estimativa do governo de Mato Grosso, em dólares, o quilômetro custaria US$ 40 milhões, contra, por exemplo, US$ 18,9 milhões em Lyon, na França. Ao todo, o projeto prevê a construção de 23 quilômetros. Para a CGU, a despesa pode superar o valor de R$ 1,2 bilhão previsto, chegando a R$ 1,5 bilhão.
No dia 6 de outubro, o analista do Ministério das Cidades Higor Guerra fez uma nota técnica em que comentou o relatório da CGU e ressaltou que a posição da controladoria coincidia com o parecer que ele havia feito no dia 8 de agosto. Essa nota, de número 123/2011, foi a fraudada.
Após um acordo político entre o Planalto e o governo de Mato Grosso, Higor Guerra recusou-se a rever sua posição contrária ao VLT. Diante disso, a diretora de Mobilidade Urbana, Luiza Vianna, adulterou o documento, usando o mesmo número da nota técnica anterior (123/2011), na mesma página 139 do processo onde estava o primeiro documento, mas alterando o conteúdo e a conclusão a favor do projeto.
Em nota, a pasta das Cidades negou a existência de fraude e disse que o caso "seguiu os trâmites legais de todos os outros processos". "Houve discussão dos prós e contras do projeto, pontos que ao final tornaram-se pacificados no parecer definitivo. Qualquer outra análise ou nota técnica que tenha sido produzida dentro dessa dinâmica ao longo do tempo pertence a um momento anterior à conclusão da análise que seguiu o trâmite legal."

 Por Estadão